Estagflação pode decretar fim da correlação com mercado de ações e retomada de alta do Bitcoin, diz especialista
Inflação associada ao crescimento da desocupação e ao declínio do setor produtivo já é uma realidade em países do primeiro mundo e criptomoedas podem se tornar o único refúgio seguro para proteção contra desvalorização do patrimônio.
A alta correlação do Bitcoin (BTC) e do mercado de criptomoedas de uma forma mais ampla com o mercado acionário neste começo de 2022, mais especificamente com o Índice Nasdaq e os papéis das empresas de tecnologia, frustrou investidores que acreditavam no potencial dos ativos digitais como reserva de valor e proteção contra inflação.
Afinal, essa é a proposta contida na narrativa de que o Bitcoin seria o “ouro digital”. Até agora, não tem sido assim, mas em um horizonte muito próximo as maiores economias do mundo devem adentrar em um período de estagflação que pode se apresentar como o teste de fogo do Bitcoin como um ativo de reserva de valor, afirmou Rufas Kamau em um artigo publicado na Forbes nesta quarta-feira, 27.
Períodos de estagflação se caracterizam pela conjunção de três fatores primordiais: inflação persistentemente alta, altas taxas de desemprego e demanda agregada estagnada.
Em geral, a estagflação tem início por conta de políticas de aperto monetário patrocinadas por bancos centrais para tentar controlar a escalada da inflação. A alta do desemprego e a queda da produção econômica são efeitos colaterais motivados pelo cenário macroeconômico e geopolítico mais amplo.
O impacto da pandemia do coronavírus sobre a cadeia produtiva, a expansão da oferta monetária patrocinada pelos bancos centrais para estimular a economia e a redução da taxa de juros prepararam o cenário para a alta da inflação.
Nos últimos dois anos, os EUA imprimiram mais de US$ 13 trilhões para promover o alívio da dívida, investimentos em infraestrutura e estímulo econômico direto à população. De acordo com Kamau, como o dinheiro novo leva alguns meses para ser incorporado à economia e ter reflexos no índice de inflação, há uma chance de que parte do dinheiro impresso no período ainda tenha impactos sobre a cadeia produtiva, gerando novas altas nos preços de produtos e serviços essenciais.
Tais medidas não se restringiram exclusivamente aos EUA. A política de expansão monetária e taxas de juros mínimas foi uma estratégia global para lidar com os impactos do coronavírus sobre a economia.
A inflação não corrói apenas o poder de compra dos cidadãos, mas também compromete a capacidade de poupar e investir. À medida que as taxas de juros voltam a subir para tentar domar a alta dos preços, as pessoas são diretamente afetadas pelo aumento do custo do dinheiro para quitar dívidas anteriormente contraídas. Como resultado, a demanda agregada na economia se reduz porque há menos recursos disponíveis nos orçamentos familiares.
Quando ao menos parte do problema parecia resolvido e finalmente a produção econômica parecia estar se encaminhando para a retomada de patamares anteriores à COVID-19, ainda que com percalços, a invasão da Ucrânia pela Rússia e os consequentes embargos impostos pelas potências ocidentais ao gigante euro-asiático contribuíram para aprofundar os desequilíbrios entre oferta e demanda de produtos essenciais como petróleo, gás e outras commodities. O resultado óbvio foi um novo impulso à já alta pressão inflacionária.
Os índices de inflação nas principais economias mundiais atingiram níveis recordes. O Índice de Preços ao Consumidor dos EUA (CPI) chegou a 8,5% anuais em março, a taxa mais alta em 40 anos. Enquanto a zona do euro registrou uma inflação anual de 7,4%.
Como resposta imediata, o Banco Central dos EUA (Fed) reverteu sua política de juros mínimos. Atualmente a taxa de juros está em 0,5% e o mercado espera que haja um novo aumento, para 1%, na próxima reunião do Fed marcada para a semana que vem.
O Banco Central Europeu (BCE) e o Banco da Inglaterra estão adotando a mesma estratégia. Para Kamau, isso significa que as principais economias do Ocidente se encaminham para um período de estagflação.
Como a estagflação pode favorecer a adoção do Bitcoin?
O declínio da produção econômica, que é um dos três fatores clássicos de estagflação, reduz o valor das empresas com capital aberto em bolsa, fazendo com que os investidores optem por outras modalidades de investimento.
À medida que a estagflação se consolida, o mercado de ações tende declinar, uma vez que o custo do capital aumenta e os lucros marginais se contraem ao longo do tempo.
Apesar do fato de o Bitcoin ainda não ter se desvinculado das ações de tecnologia, há uma boa chance de que um impulso de baixa adicional nessas ações resulte em dissociação.
Historicamente, o aumento da taxa de juros favorece o investimento em títulos do tesouro. No entanto, até agora o aumento não foi suficiente para tornar os juros positivos diante dos elevados índices de inflação. É aí que as criptomoedas – e mais especificamente o Bitcoin – se apresentam como uma alternativa para preservação de patrimônio no longo prazo.
Além da queda do mercado acionário, que até agora tem arrastado o Bitcoin consigo, a depreciação de moedas fiduciárias duplamente potencializada pela expansão monetária pós-COVID-19 e pela alta da inflação torna os instrumentos financeiros tradicionais menos atrativos, apesar de mais seguros.
A redução contínua da quantidade de Bitcoin disponível nas exchanges atualmente é o principal fator capaz de contribuir para o rompimento do alto grau de correlação entres os mercados acionário e o de criptomoedas, segundo Kamau.
O analista aponta que houve uma redução de 18% do suprimento de Bitcoin mantido nas exchanges entre maio de 2020 e abril de 2022. A contínua redução da liquidez tende a fazer com que o Bitcoin se torne mais escasso no mercado, resultando na dissociação entre os preços do BTC e os das ações.
Caso isso se confirme, a estagflação terá sido o fator fundamental para ampliar a adoção da principal criptomoeda do mercado, confirmando seu potencial como ativo de reserva de valor.
Por enquanto, no entanto, a correlação mantém-se firme. Conforme noticiou o Cointelegraph Brasil, na terça-feira, 26, assim que o pregão de Wall Street foi aberto,o Bitcoin quebrou abaixo do suporte de US$ 38.000.
No início da tarde desta quarta-feira, o par BTC/USD está sendo negociado a US$ 39.265, e registra uma alta intradiária de 1,5%, de acordo com dados do CoinGecko.
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