Venda de jogador com criptomoedas permite a clube argentino receber o dobro do valor pago pelo São Paulo
Negociação selada através de pagamento realizado com a stablecoin atrelada ao dólar USD Coin (USDC) teria permitido ao Clube Atlético Banfield fazer a conversão para pesos argentinos do valor pago pelo São Paulo no mercado paralelo.
A primeira negociação de um jogador de futebol com pagamento realizado em criptomoedas na América do Sul continua reverberando além do ambiente esportivo devido a um subterfúgio financeiro que teria feito com que os US$ 4 milhões pagos pelo São Paulo através da stablecoin USD Coin (USDC) se multiplicassem por dois ao serem convertidos em pesos argentinos pelo Clube Atlético Banfield.
Enquanto o presidente do clube argentino, Eduardo Spinosa, afirma que a transação envolvendo Giuliano Galoppo teria rendido US$ 8 milhões, os dirigentes do São Paulo admitem terem pago ao Banfield apenas US$ 4 milhões. Outros US$ 2 milhões teriam sido desembolsados em comissões, impostos e outros encargos burocráticos.
A divergência de valores causou surpresa para além do mundo futebolístico, provocando manifestações públicas do Banco Central argentino. Ao que tudo indica, a instituição teria sido envolvida por uma tabelinha entre os dirigentes do Banfield e as criptomoedas.
O pagamento em USDC permitiu que o clube evitasse fazer a conversão do pagamento em dólares através do câmbio oficial determinado pelo Banco Central da Argentina, relata reportagem do GE.com.
As duas cotações do dólar na Argentina
A política de controle de capitais implantada pelo governo argentino para tentar conter a inflação no país faz com que o dólar tenha uma dupla cotação nos mercados financeiros locais, com valores sensivelmente divergentes.
A cotação oficial determinada pelo Banco Central tem um valor bastante inferior à cotação do mercado paralelo, também conhecido como “dólar blue”. Na quinta-feira, 4, por exemplo, no câmbio oficial, um dólar era vendido a 138 pesos, enquanto no mercado paralelo, era negociado por 291 pesos. Ou seja, mais do que o dobro do valor determinado pelo Banco Central.
Essa diferença explica por que os US$ 4 milhões que teriam sido pagos pelo São Paulo ao Banfield podem podem ter se multiplicado, chegando a US$ 8 milhões quando convertidos em pesos argentinos.
Em uma transação realizada com moeda fiduciária, necessariamente a operação passaria pelo Banco Central, pois a instituição obriga que negócios internacionais feitos com a utilização de moedas estrangeiras devem ser realizados através da instituição e convertidos pelo câmbio oficial. Por não serem emitidas por bancos centrais, os criptoativos não se enquadrariam na definição de moeda estrangeira. Portanto, permitiriam ao clube “driblar” a norma legal.
Em entrevista ao TyC Sports, um dos principais veículos esportivos da argentina, Spinosa explicou os benefícios da utilização de criptomoedas para efetivação da venda de Galoppo, disse que foi dele que partiu a ideia e não se furtou a mencionar abertamente os valores envolvidos:
“Se o clube recebe essa receita em moeda estrangeira, está obrigado a convertê-la pelo câmbio oficial. Nós sentamos com o São Paulo e dissemos que aceitávamos fazer esta operação por tantos milhões de pesos, equivalentes aos US$ 8 milhões do passe.”
O Banfield teria fixado o valor do passe de Galoppo em 1 bilhão de pesos argentinos, o que seria equivalente a aproximadamente US$ 8 milhões no câmbio paralelo e US$ 4 milhões no câmbio oficial.
Trata-se de “uma solução inovadora que faz o esforço ser multiplicado por dois em relação aos pesos que o Banfield receberá”, afirmou Spinoza, reafirmando que o acordo cumpre “100% da normativa legal e cambial” determinadas pelas leis argentinas.
O negócio entre o São Paulo e o Banfield ocorre em um momento em que o governo argentino está tentando impor limites à adoção de criptomoedas pela população do país, uma iniciativa que conta, inclusive, com o apoio do FMI (Fundo Monetário Internacional).
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