Profissão cripto: o que faz um CFO, com Carlos Russo da Transfero Swiss
Chief Financial Officer, ou CFO, é um cargo conhecido do mundo corporativo que toma uma forma diferente no mundo das criptomoedas.
Afinal, além de lidar com as finanças de uma empresa, o profissional deve estar por dentro do que há de mais inovador nesse ramo. Desde 2020, isso significa, invariavelmente, ser também um especialista em finanças descentralizadas (DeFi).
Foi o interesse desde muito cedo pelo mercado financeiro que fez Carlos Russo, carioca de 31 anos, sair da faculdade de engenharia de produção diretamente para o setor bancário. Do BTG Pactual, Russo seguiu para um fundo de investimentos focado em startups, onde conheceu a Transfero Swiss, na qual ocupa o cargo de CFO.
A Transfero tem sede na Suíça, mas começou sua história na Bit.One, um gateway de pagamentos para criptomoedas no Brasil. Hoje, a companhiam se dedica ao gerenciamento, custódia e tokenização de ativos digitais. Além disso, é criadora do BRZ, uma stablecoin com preço pareado ao real.
Em conversa com o BeInCrypto, Carlos Russo conta um pouco da sua história e explica o que afinal um CFO de empresa cripto faz. Ele também passa por suas incursões em DeFi e explica por que esse setor é o mais promissor – e por que jovens devem aproveitar a oportunidade o quanto antes.
O que faz um CFO de uma companhia do setor de criptomoedas?
“O CFO tem um lado estratégico. Especificamente na indústria de criptomoedas, a gente tem preocupação com a gestão de recursos de terceiros e próprios. Para gestão de recursos próprios a gente tem a nossa Tesouraria, a gente investe nosso dinheiro em estratégias de investimento, seja no mundo cripto, seja fora do mundo cripto, e na parte de gestão de recursos de terceiros, garantir que os recursos das pessoas, que estão dentro do nosso mandato de investimento, sendo aplicados corretamente
Tem também uma área mais técnica que envolve planejamento tributário, contabilidade, que envolve garantir que que todas as transações financeiras da empresa estejam de acordo com a Lei e que a gente faça os registros apropriados das transações para que possa publicar todas as demonstrações financeiras, balanços patrimoniais, demonstrativo de resultados do exercício.
No caso da Transfero existe ainda uma complexidade um pouco maior, que é o fato de ser uma empresa internacional, é uma multinacional. A gente tem empresas na Suíça, no Brasil, na Argentina, Estônia, Bahamas… Então essa parte internacional também adiciona um pouco de complexidade. Você tem tanto que saber e decidir como a empresa deve investir o dinheiro próprio e como a gente deve garantir que a empresa está, dentro do seu mandato, investindo corretamente os recursos de terceiros.“
Como foi a trajetória da engenharia para o mercado de criptomoedas?
“Eu costumo dizer que o engenheiro é um profissional bem versátil. Então os engenheiros normalmente viram consultores, trabalham no mercado financeiro, em chão de fábrica, em diversas indústrias. Desde a faculdade sempre me interessei por finanças. A Engenharia de Produção ou Engenharia Industrial é um curso que tem bastante gente que gosta do mercado financeiro. Então logo que me formei eu já com esse interesse fui para o BTG Pactual. Depois fui para um fundo de Venture Capital que investiu em startups e, através desse fundo, acabei conhecendo a Transfero Swiss.
Inicialmente entrei na Transfero junto com o antigo CFO, que acabou saindo depois de dois anos para tocar um projeto pessoal. Aí acabei assumindo a posição de CFO e me tornando sócio. Sempre estudando muito. É uma profissão que exige muito, exige um conhecimento prático e teórico importante. Então nesse meio tempo eu fiz um mestrado aqui no Brasil e um no exterior também, na Universidade da Pensilvânia, então isso me agregou também o conhecimento que eu uso hoje no meu dia a dia de trabalho.“
Como a trajetória influenciou na liderança do projeto da stablecoin BRZ?
“O BRZ, além de um projeto que tem duas frentes muito importantes, uma o desenvolvimento comercial desse ecossistema que a gente criou. O BRZ é muito útil como meio de pagamento, então a gente precisa que ele esteja listado em exchanges no Brasil e no exterior, em países emergentes. É importante ter experiência de trabalho internacional, então ter feito mestrado fora me tornou mais hábil para fazer negócios internacionais dentro da Transfero Swiss. Que por sua vez também é uma empresa internacional.
Por outro lado o BRZ, certa forma, envolve a gestão de recursos de terceiros. A responsabilidade da Transfero é garantir que se há 300 milhões de BRZ em circulação, como há hoje, existem R$ 300 milhões equivalentes no seu colateral. Para fazer a gestão desse colateral de modo a ser rentável para empresa, para pagar as contas da empresa, e ao mesmo tempo ter uma segurança de que é de fato o colateral dos BRZs em circulação, é preciso conhecimento de finanças: onde aplicar, que nível de risco a pode estar exposto, que tipo de banco vai deixar o dinheiro, se é seguro, se é melhor dividir entre diferentes bancos para reduzir o risco.
Todo mundo que está dentro desse mercado precisa, por exemplo, saber inglês, espanhol, viajar, conversar com pessoas diferentes culturas. É um mercado muito internacional, então para trabalhar em cripto de fato precisa ser uma pessoa que queira trabalhar em empresas internacionais. Por outro lado é preciso do conhecimento técnico na área de atuação para que isso se reflita um bom trabalho e uma boa gestão.“
Como está a demanda por profissionais do ramo de finanças descentralizadas (DeFi)?
“Essa é a principal demanda que existe hoje no mercado. São profissionais que, aliados ao seu conhecimento na técnico acadêmico, conseguem também empregar conhecimento de programação em blockchain. É o futuro dentro dentro da indústria. As disrupções que aconteceram no último ano dentro da indústria projetos como o Uniswap, que é uma exchange totalmente automatizada que praticamente tira um pouco do papel das exchanges centralizadas, como Binance ou Mercado Bitcoin aqui no Brasil. Agora você pode fazer tudo isso por meio de uma exchange autônoma, sem intervenção humana.
Também os protocolos de empréstimo, que acabam substituindo um pouco o papel do próprio banco. O Compound, por exemplo, em que você deposita sua cripto e serve de colateral para um empréstimo em BRZ, converte em reais no Brasil e gasta para comprar um carro, um apartamento. Então tudo isso ficou muito mais facilitado com DeFi.”
Com quais outras inovações em DeFi esse profissional pode contribuir?
“Por exemplo, um fundo de investimento é um modelo de negócio totalmente digital hoje. Não é necessário mais um fundo totalmente regulado pela CVM ou pela Anbima. Isso agora é possível de ser programado dentro de um smart contract, replicando as boas práticas da indústria no ambiente descentralizado como DeFi. Já existem projetos como o Yearn Finance, em que você consegue criar estratégias, as pessoas investem na sua estratégia e funciona como um fundo que tem o seu gestor e colocou sua estratégia. E isso ocorre em um ambiente totalmente descentralizado.“
Então, hoje, profissionais que aliam essa capacidade técnica, de análise, de finanças, e conseguir implementar isso dentro de um ambiente DeFi, esse profissional certamente vai se destacar numa indústria que cresce a dois, três dígitos aos ano. E certamente daqui a cinco anos será um profissional super requisitado. A gente tem muita demanda de contratação dentro da Transfero Swiss por esse tipo de profissional. Um profissional de mercado financeiro que consegue entender o que esse ecossistema e aplicar processo de mercado financeiro dentro de uma linguagem smart contract dentro de um ecossistema do Ethereum, da Solana.”
O DeFi pode ser também uma arma para empreender no mundo inteiro sem precisar sair do Brasil?
“Com certeza. O DeFi não tem fronteira. A Uniswap, por exemplo, é um protocolo que foi programado para rodar na infraestrutura do Ethereum. A pessoa que criou não precisa nem dizer quem é, ela pode se esconder atrás, por exemplo, de um avatar. Esses protocolos são dominados pelos tokens de governança. Então partir do momento que você e um grupo de pessoas que têm conhecimento para implementar um projeto desse porte conseguem fazer uma programação de um smart contract, criem um modelo de negócio em que fiquem com uma parte dos tokens de governança, e uma parte dão ao mercado como recompensa por usar aquela plataforma, isso já está no ambiente internacional.
O DeFi abre possibilidades que nas exchanges centralizadas ou não são possíveis ou existe muito medo quanto ao risco regulatório. “
Pode dar exemplos?
“Por exemplo, há muito tempo se fala dos security tokens, tokens representativos de ações de empresa e outros títulos e valores mobiliários. Quando você joga ele dentro do DeFi, é impossível qualquer autoridade regulatória do mundo de fato derrubar aquele ambiente, porque ele roda no ambiente descentralizado, como é o Ethereum.
O DeFi, além de ser nativamente ao que não tem jurisdição específica, ele de certa forma se blinda de qualquer influência de autoridade regulatória e de qualquer país, inclusive nos Estados Unidos. Todo mercado acaba sempre se preocupando com o posicionamento da SEC americana com qualquer lançamento de um token novo. Aqui no Brasil alguns tokens consultaram a CVM, como por exemplo o token do Vasco da Gama. Mas, quando você lança isso já no ambiente DeFi, esse tipo de consulta não é necessária. Porque não há nada que nenhuma autoridade regulatória do mundo possa fazer contra um token que rode e seja negociado no ambiente DeFi.
Dentro do aspecto internacional é uma bala de prata que que veio para ficar e vai provocar muito a revolução ainda no mundo financeiro.“
Qual caminho você sugere a interessados em trabalhar no ramo das criptomoedas?
“Cripto é um subsistema do mercado financeiro que é muito maior. Apesar de cripto ter o próprio caminho e ter seus próprios desafios, ele eventualmente vai se fundir com o financeiro tradicional. Tudo que a gente construiu dentro dessa lógica de inovação vai impactar em algum momento os players mais consolidados mercados, e aí essas duas forças vão se juntar. Então, para quem entra em cripto hoje, só estudar crypto é pouco.
A pessoa tem que ser um profissional que esteja apto a trabalhar no mercado financeiro em geral e crypto ser uma área de especialização. Entrar em um banco de investimento, trabalhar com fusões e aquisições, com avaliação de empresas, com mercado de capitais, investimento em ações, avaliações de ações, trabalhar em um fundo. Esse profissional tem que se qualificar em áreas do conhecimento como economia, finanças, mercado financeiro, estatística. os conhecimentos base, então, devem ser aplicados no mercado de cripto
Então o profissional que se preparar para ser de mercado financeiro e de cripto, que entenda de linguagem de programação, consiga automatizar processos, que entenda as novas linguagens de programação, como solidity do Ethereum, que consiga implementar conhecimentos financeiros dentro de uma linguagem de smart contracts, é o profissional que vai estar na fronteira do conhecimento e vai ser um profissional super disputado no Brasil e no exterior dentro de muito pouco tempo, em dois a três anos. É realmente o profissional do futuro.“
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