Órgão regulador oficia corretoras brasileiras de criptomoedas sob pena de multa de até R$ 100 mil
A batalha entre os bancos e as corretoras de criptomoedas tem novo capítulo no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Dez exchanges e uma OTC terão até o dia 19 deste mês para responder um questionário enviado pelo órgão regulador sob pena de pagamento de multa diária de R$ 5 mil. Caso não haja resposta, o valor pode chegar a R$ 100 mil.
O documento foi enviado para as corretoras no final da tarde de segunda-feira (01) pela Superintendência-Geral do Cade. No último mês, a autarquia abriu um inquérito para apurar se os fatos trazidos ao seu conhecimento por meio do processo administrativo movido pela Associação Brasileira de Criptomoedas e Blockchain (ABCB) “constituem indícios de práticas anticoncorrenciais”.
Assim como os bancos tiveram de prestar esclarecimento sobre os motivos que levaram essas instituições a fechar contas de exchanges, eis que chegou a vez das corretoras de responder onze questões levantadas pelo Cade. As empresas oficiadas foram as seguintes: Mercado Bitcoin, Bitcambio, BitcoinTrade, Foxbit, Walltime, Braziliex, BitBlue, Capital Digital Aberto (OTC), e-juno e Profitfy.
Além de informar os dados do responsável pela resposta do questionário “de maneira a possibilitar o contato” do órgão regulador, as operadoras terão que dar detalhes sobre suas atividades.
O órgão regulador afirmou, por meio do mesmo documento, que as corretoras não poderão deixar de responder o questionário. A recusa será multada:
“Nos termos do art. 40 da Lei nº 12.529/2011, a recusa, omissão ou retardamento injustificado das informações ou documentos solicitados constitui infração punível com multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), podendo ser aumentada em até 20 (vinte) vezes, se necessário para garantir sua eficácia, em razão da situação econômica do infrator.”
Perguntas para as corretoras de criptomoedas
O questionário foi dividido em duas partes. A primeira parte se limita apenas na apresentação da corretora e pede para esclarecer como é a sua atuação no Brasil.
Em seguida, contudo, vem um rol de dez questões. Entre as primeiras perguntas, estão aquelas sobre possíveis prejuízos sofridos pelas exchanges com o encerramento de suas contas. As corretoras, para tanto, tem de esclarecer se elas já tiveram “abertura de conta recusada” ou “conta encerrada em alguma instituição financeira”.
O Cade quer saber também, por meio desse questionário, a respeito das ações judiciais enfrentadas pelas corretoras. Quanto a esse ponto, foi questionado se a empresa possui conta aberta em algum banco e se essa conta “está aberta em função de liminar obtida na Justiça ou não”.
Como um dos principais motivos apontados pelos bancos para encerrar as contas correntes ou se negar a abrir essas para essas empresas era a ausência de Classificação Nacional de Atividade Econômica (CNAE), o Cade pediu que essas empresas esclarecessem como elas declaravam “sua atividade principal aos bancos, na hora de solicitar a abertura de uma conta”.
As instituições financeiras haviam acusado as corretoras de não adotar medidas para conhecer os seus clientes e de não tomar precaução sobre possível atividade ilícita deles. Talvez essa tenha sido a razão de o órgão regulador perguntar sobre as políticas de segurança dessas empresas para estabelecer um monitoramento sobre as transações de seus clientes.
O Cade solicitou que a corretoras explicassem “em detalhes, todas as políticas de prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo ou crime organizado adotadas por sua empresa”. Também perguntaram sobre o processo que as corretoras fazem “na hora de aceitar um cliente” e se já se recusaram a fazer transações com alguns deles tendo, inclusive de apresentar o motivo.
As empresas podem, assim como os bancos, solicitar que parte de suas respostas não sejam exibidas em púbico e que apenas o Cade tenha acesso. Para isso, basta que a corretora envie uma versão classificada como “acesso restrito” e uma versão pública.
O sigilo das respostas, entretanto, vai depender de uma análise do Conselho Administrativo de Defesa Econômica, conforme está nos artigos 92 a 95 do Regimento Interno do Cade. (Leia abaixo o questionário completo).
O processo
As instituições financeiras haviam sido questionadas antes de a Superintendência-Geral do Cade decidir sobre a abertura do inquérito administrativo. Os bancos generalizaram as exchanges como empresas que levantam suspeitas de prática ilícita.
O órgão regulador, então, respondeu em face isso que:
“Não parece razoável que os bancos apliquem medidas restritivas a priori, de forma linear a todas as empresas de criptomoedas, sem analisar o nível de compliance e as medidas anti-fraude adotadas por cada corretora, individualmente, conferindo um tratamento de ilegalidade per se à atividade de corretagem de criptomoedas.”
O inquérito é um desdobramento do processo administrativo movido pela ABCB. A Associação levou o fato ao conhecimento do Cade após o encerramento da conta da Atlas Quantum pelo Banco do Brasil.
Esse, entretanto, não era um caso isolado, pois desde 2015, as empresas que transacionam criptomoedas têm enfrentado uma verdadeira guerra iniciada pelos bancos e os casos estão abarrotando o judiciário. O mais emblemático é entre o Mercado Bitcoin e o Banco Itaú que aguarda decisão do Superior Tribunal de Justiça.
O fato é que com todo esse cenário em volta, não havia outra saída senão a Superintendência–Geral do Cade promover o inquérito administrativo para investigar possível conduta anticoncorrencial, prática vedada pela Lei 12.529/2011.
Leia abaixo o questionário completo do Cade:
Parte 1: Informações gerais
1.Apresentar nome, cargo, telefone e e-mail do responsável pela resposta a este questionário, de maneira a possibilitar o contato desta Superintendência caso seja necessário algum esclarecimento adicional.
2.Descrever brevemente a atuação da empresa no Brasil.
Parte 2: Informações
1. A sua empresa possui conta(s) aberta(s) em alguma instituição financeira? Favor listar todos os bancos em que a sua empresa, atualmente, tem conta, indicando se a conta está aberta em função de liminar obtida na justiça ou não.
2. A sua empresa já teve a conta encerrada em alguma instituição financeira? Explicar, detalhadamente, citando o banco, a forma como ocorreu o encerramento da conta e a justificativa apresentada pelo banco. Favor juntar qualquer documentação que comprove as informações apresentadas. Informe também os prejuízos sofridos por sua empresa em função do encerramento da conta.
3. A sua empresa já teve a abertura de conta recusada por alguma instituição financeira? Explicar, detalhadamente, citando o banco e as justificativas apresentadas para justificar a não abertura da conta. Favor juntar qualquer documentação que comprove as informações apresentadas. Informe também os prejuízos sofridos por sua empresa em função da não abertura da conta.
4. Em função da ausência de um código específico para a atividade de corretagem de criptomoedas na Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), como a sua empresa declara sua atividade principal aos bancos, na hora de solicitar a abertura de uma conta?
5. A sua empresa toma precauções para evitar fraude e lavagem de dinheiro por parte de seus clientes? Explique, em detalhes,todas as políticas de prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo ou crime organizado adotadas por sua empresa.
6. A sua empresa adota medidas para conhecer os seus clientes (Know Your Customer)? Descreva, em detalhes, todas as medidas adotadas por sua empresa na hora de aceitar um cliente.
7. A sua empresa já se recusou a fazer transações para determinados clientes? Explique o motivo.
8. A sua empresa consegue monitorar as transações de seus clientes? Como é feito esse monitoramento? Descreva em detalhes, especificando se a sua empresa consegue saber a origem e o destino de todos os recursos transacionados por seus clientes.
9. A sua empresa aceita que seus clientes efetuem transações por método não rastreável, como, dinheiro em espécie? Em caso afirmativo, explique o motivo e qual o percentual das transações que são feitas por método não rastreável.
10. Dê outras informações que considerar relevantes.
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