Pressão da SEC pode beneficiar o mercado cripto no Brasil, comentam especialistas

Medidas podem desacelerar o investimento em startups do mercado cripto, mas efeito será limitado aos Estados Unidos

Os processos movidos na semana passada pela SEC contra as exchanges Binance e Coinbase criaram um ambiente de insegurança jurídica no mercado de criptomoedas dos Estados Unidos. Cenários onde há falta de clareza regulatória são evitados por fundos de investimento, o que pode prejudicar startups estadunidense. Nesse sentido, surge a preocupação de que essa desaceleração possa contaminar outras regiões.

Fontes ouvidas pelo Cointelegraph Brasil destacam, no entanto, que a cruzada do regulador dos EUA contra as criptomoedas não deve afetar o restante do mundo. Além disso, países da América Latina, em especial o Brasil, podem ser beneficiados por esse episódio.

Impactos limitados aos EUA

As investidas da Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC) contra Binance e Coinbase, vistas na semana passada, preocuparam investidores de criptomoedas. 

Desta vez, um tom ainda maior de seriedade pôde ser percebido nas ações do regulador estadunidense, que considerou mais de 60 criptoativos como valores mobiliários. A lista desses ativos inclui criptomoedas com valor de mercado significativo, como Polygon (MATIC), Solana (SOL) e Cardano (ADA). A incerteza sobre qual será o próximo passo da SEC tem deixado empresas sediadas no país.

Entre essas empresas estão os fundos de capital de risco, que estão buscando novas regiões para estabelecerem suas atividades, afirma João Kamradt, Head de Research e Investimentos da viden.vc. Na avaliação de Kamradt, isso pode atrapalhar o processo de investimento.

“Mas a inovação é irrefreável. Estamos em um mercado de construção, com oportunidades surgindo, e muitos fundos estão à procura de oportunidades enquanto observam o cenário macroeconômico para se posicionar”, salienta Kamradt. “A maioria de fundos já está constituída em países com legislações amigáveis tanto a fundos de investimento quanto ao setor cripto, então acabam não sendo prejudicados”, completa.

Além disso, o porta-voz da viden.vc comenta que essa tensão regulatória ocorreria de qualquer forma. Agora que a situação escalou, essa pode ser uma oportunidade para caracterizar ativos digitais de forma clara nos Estados Unidos, possivelmente gerando maior segurança para investidores institucionais, diz Kamradt.

José Gabriel Bernardes, sócio da gestora Fuse Capital, concorda que o movimento da SEC já era esperado. Ele considera normal, então, o aumento no risco de se investir em startups relacionadas a ativos digitais nos Estados Unidos. 

Por outro lado, o sócio da Fuse afirma que a jurisdição das startups de criptoativos estão cada vez mais diversificadas. “Se olharmos as quinze maiores empresas em valor de mercado do setor cripto, eu diria que uma ou duas estão sediadas nos Estados Unidos. Ainda temos uma curva de inovação, mas ela não está acontecendo nos EUA”, diz Bernardes.

O representante da Fuse fala ainda sobre a redução nos investimentos destinados às startups nos Estados Unidos, que não se limita apenas à indústria blockchain. Um ponto positivo nesse cenário é que muito capital tem sido dedicado a outras regiões do mundo. “Por exemplo, o Brasil está ganhando reconhecimento global, e tem sido em escala exponencial”, diz Bernardes.

Outro lado positivo é que o valuation das empresas da indústria blockchain, que antes era esticado, se tornou mais realístico, acrescenta o sócio da Fuse.

Benefícios para a América Latina

Frente à saída de empresas de ativos digitais dos Estados Unidos, é importante saber quais regiões tendem a ganhar com esse movimento. Ambas as fontes ouvidas pelo Cointelegraph Brasil apontam que a América Latina tem muito a ganhar, sediando as empresas que deixaram os EUA e recebendo capital estrangeiro.

Bernardes, da Fuse, compara Estados Unidos e países da América Latina com empresas. Os EUA seriam empresas já consolidadas, que desejam manter o status de dominância. Por isso, abraçar novas tecnologias, como a blockchain, pode ser uma tarefa mais difícil em razão dos riscos. “Os EUA enxergam a blockchain como uma alavanca pequena perto da grandiosidade da sua economia”, diz.

Já países da América Latina, como o Brasil, têm menos a perder. É possível para esses países, então, correr mais riscos para assumir um papel de maior relevância. 

“Essa postura de crescimento tem se mostrado super positiva nos últimos meses […] Está chamando mais do que capital, está chamando talento, o Banco Central do Brasil já ganhou por dois anos seguidos como melhor do mundo. Esse tipo de postura está evoluindo positivamente”, acrescenta Bernardes.

João Kamradt, da viden.vc, também avalia que o Brasil e outros países da América Latina podem ganhar com a pressão feita pela SEC sobre o mercado de criptomoedas dos EUA. É necessário, porém, que a legislação nesses territórios continue amigável à indústria blockchain.

“O mercado cripto está passando por um build market, então temos inúmeras soluções surgindo, muitas delas em setores até então inexistentes. Os governos da América Latina precisam entender isso e precisam entender que essa inovação decorre de muita experimentação para poderem se beneficiar”, diz Kamradt.

Além disso, o porta-voz da viden.vc avalia que o Brasil e demais países latino-americanos enfrentam forte concorrência de outras regiões. Ele menciona Vietnã, Cingapura, Tailândia e regiões do Oriente Médio, como Emirados Árabes Unidos e Arábita Saudita.

“O recado é de que, embora haja oportunidade, há concorrência e é necessário criar as condições para que o mercado migre para cá”, conclui Kamradt.

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