Regulação de Criptomoedas: o que é preciso saber? (parte 1)
Diante do crescimento explosivo do mercado de criptoativos, estamos assistindo uma explosão no exame regulamentar pelas autoridades financeiras em diversos países. Como não poderia ser diferente, vimos recentemente o Senado brasileiro aprovar o Projeto de Lei nº 3825, que incorporou o Projeto de Lei nº 2303/2015 e precisará passar pela Câmara dos Deputados, antes de tornar-se lei.
O que uma boa legislação precisa ter? Quais as principais dúvidas dos reguladores? As regras já em vigor já são suficientes, ou precisamos de novas regras para disciplinar criptomoedas? É realmente possível implementar regulamentação para inovações tecnológicas? Quem define a regulação? Quais são os riscos?
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No artigo de hoje, buscaremos responder estas perguntas, além de trazer mais alguns pontos cuja reflexão pode contribuir para o debate entre legisladores, reguladores e sociedade.
As preocupações regulatórias com as criptomoedas
- Os constantes alertas da mídia
A mídia tem alertado constantemente que os criptoativos (criptomoedas e tokens) e finanças descentralizadas (DeFi) não são regulamentados ou estão em uma zona legal indefinida.
Para se compreender porque esses alertas são usados com frequência pela mídia, é necessário conhecer algumas informações básicas.
- Qual é o propósito de uma regulação? Por que precisamos criar leis para disciplinar algo?
Primeiro, há uma estabilidade sistêmica que a regulação do mercado financeiro tenta manter, o que significa que não estamos olhando apenas individualmente para essa ou aquela corretora, para essa ou aquela instituição ou indústria, mas olhamos para o sistema como um todo e tentamos reduzir e avaliar os riscos decorrentes de conexões existentes no sistema financeiro global.
A proteção do consumidor e do investidor, especialmente dos investidores individuais, é muito importante. Além da necessidade de se evitar comportamentos abusivos no mercado. Isto é, impedir o uso de informações privilegiadas ou informações falsas para garantir o funcionamento adequado e eficiente dos mercados financeiros. E é aí que entra a regulamentação.
Para evitar abusos e proteger os consumidores, é necessário um mínimo de regulamentação para garantir que todos os participantes do mercado (corretoras, investidores, por exemplo) sob o mesmo tipo de risco, sejam tratados de forma igual, sem discriminação.
- Neutralidade tecnológica
Um ponto importante a ser considerado quando falamos em regulação é a “neutralidade tecnológica”. Não se regula a tecnologia, mas o mercado criado em torno desta tecnologia dado que alguma regulamentação é essencial para proteger os clientes, investidores e definir as regras do jogo no mercado financeiro. Podemos dizer, em resumo, que a neutralidade tecnológica significa regular funções, não tecnologias.
- A dificuldade de vinculação jurisdicional devido ao caráter intangível dos criptoativos
Outro ponto a considerar é o fato de que os órgãos reguladores e legislativos estão aprendendo, assim como a própria comunidade de criptomoedas, a lidar com todas essas plataformas, todas essas redes.
A natureza inovadora e extraterritorial da tecnologia blockchain e a falta de vinculação jurisdicional associada aos criptoativos é um fato novo que leva não só reguladores, mas também a própria indústria de criptoativos a um aprendizado constante.
O fato das criptomoedas serem um ativo global, que pode ser transferido facilmente em minutos para qualquer lugar do mundo, aliado a sua característica de intangibilidade, torna praticamente impossível sua regulação por qualquer país, sem a colaboração de outros governos. Bem por isso, as diretrizes do GAFI ganharam uma importância ímpar, como já mencionamos em outro artigo.
Para dificultar um pouco mais, não podemos esquecer de que o regulador é sempre o último a perceber o que está acontecendo no mercado, e o primeiro a ser acionado quando alguém precisa de orientação.
Reguladores vs Legisladores: papéis diferentes no ecossistema
Os reguladores e aqueles que realmente fazem leis têm papéis diferentes no ecossistema dos criptoativos (criptomoedas e tokens).
Quando você fala sobre regulamentação e alguém decide se estabelecer em algum setor, o regulador deve agir. Mas não é o regulador quem legisla.
Quem cria a lei são os órgãos legislativos, isto é, o parlamento, o Congresso Nacional e seus deputados e senadores.
Os reguladores, por sua vez, apenas orientam e aplicam as leis. Mas como os reguladores devem orientar e fornecer informações sobre como aplicar a lei a esse novo fenômeno dos criptoativos e das finanças descentralizadas (DeFi)?
Inovação vs Risco
Há sempre uma relação entre inovação e risco. Os reguladores costumam ser avessos ao risco, porque são o que procuram evitar, mas é importante enfatizar que a inovação deve acontecer junto com o regulador, buscando soluções construtivas para os novos desafios que surgem no mundo das criptomoedas.
É contraditório falar em regulação de criptomoedas?
Alguns argumentam que seria contraditório pensar na regulação de criptomoedas. Isto porque, elas vieram justamente para contrabalançar a interferência do governo na privacidade e política monetária dos cidadãos.
Já outros veem que a regulamentação bem elaborada, é importante para o desenvolvimento saudável do ecossistema blockchain e dos criptoativos. Veremos mais um pouco sobre este tema no próximo artigo desta coluna.
Takeaway: o que uma boa legislação precisa ter?
Reguladores de outros países dizem que faz parte do seu trabalho proteger os consumidores de novas criptomoedas duvidosas e, portanto, os reguladores costumam ser bastante cautelosos em alertar os consumidores sobre as características de alto risco e as bolhas de preço das moedas virtuais.
É importante refletir, no entanto, até que ponto uma postura protetora é saudável, e em que sentido a legislação sobre criptomoedas deve intervir. Deve-se colocar a proteção do consumidor sempre à frente da liberdade individual de escolha?
A resposta, neste caso, deve oscilar, pois inúmeros fatores como nível educacional da população a ser atingida pelo legislador, tradição que prevalece no país, entre outros, merecem ser considerados.
Aqui, como exemplo de uma abordagem menos restritiva e mais a favor da liberdade individual, podemos citar a posição dos reguladores suíços que, diante do equilíbrio entre a defesa do consumidor e a liberdade individual, adotam uma postura que privilegia mais a liberdade dos cidadãos. (The Economist, 2018).
Neste contexto, uma boa legislação deve ser capaz de prevenir e mitigar riscos, possibilitar os benefícios da tecnologia, sem retirar completamente a liberdade individual de escolha dos cidadãos.
Por fim, é importante destacar que no Brasil, qualquer legislação que pretenda regular o mercado de criptoativos deve ter como balizas a “livre iniciativa “ – princípio fundamental da República, previsto no artigo 1º da Constituição Federal –, bem como a “liberdade de concorrência” – princípio da ordem econômica e social, também previsto em nossa Constituição, no parágrafo único do artigo 170.
E você, acha que a proteção ao consumidor tem mais importância que a liberdade individual de escolha?
Sabia a diferença entre legisladores e reguladores? Acha contraditório falar em regulação de criptomoedas? Consegue enxergar que a tecnologia é uma ferramenta que pode ser usada para o bem e para mal, mas que a regulação deve recair sobre a indústria (não a tecnologia) e não pode impedir a entrada de novos players no mercado?
Conhecimento é poder!! Nos vemos em breve!
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