Blockchain conectará aduanas de Brasil, Uruguai, Paraguai e Argentina até março de 2020, segundo Receita Federal

Receita Federal do Brasil anunciou que o bConnect conectará as aduanas de Brasil, Uruguai, Paraguai e Argentina até março de 2020 por meio de um sistema totalmente baseado em blockchain

A Receita Federal do Brasil, por meio de seu auditor-fiscal, Sérgio Alencar anunciou que a plataforma baseada em blockchain, bConnet, será lançada oficialmente até março de 2020. A aplicação deve conectar por meio da tecnologia blockchain, as aduanas do Brasil, Uruguai, Paraguai e Argentina.

O projeto inédito vem sendo desenvolvido pelos organismos de fiscalização federal de cada país juntamente com o Serpro, empresa pública de tecnologia do Brasil. O objetivo da plataforma é “garantir que as mercadorias que estão passando pela fronteira sejam aquilo que os exportadores e importadores declaram que são”. 

A Receita Federal já havia anunciado os desenvolvimentos do bConnect no primeiro semestre de 2019, quando os trabalhos em torno da aplicação começaram. Até o momento duas reuniões de trabalho multilateral já aconteceram entre os países e foi definido que a rede começaram com o compartilhamento de um conjunto de informações e deve agregar novos dados na medida em que for sendo desenvolvida, seguindo o mesmo ‘rito’ adotado pela Receita com o bCPF, aplicação que também é baseada em blockchain e irá ‘agregando’ dados ao longo de seus desenvolvimento.

“A rede bConnect começará permitindo o compartilhamento de informações de Operadores Econômicos Autorizados (OEA), porém já há previsão de incremento da rede para atender o compartilhamento de informações de Declarações Aduaneiras”, informa Paulo Ramos, representante da Superintendência de Relacionamento com Clientes Fazendários e Comércio Exterior do Serpro.

Segundo uma entrevista concedida por Alencar ao Serpro, a tarefa ‘inicial’ é padronizar as informações entre as aduanas para criar uma aplicação única.

“Nosso desafio, inicialmente, é facilitar a troca de informações, entre aduanas do Mercosul, a respeito de empresas exportadoras. Para fazer um acordo entre dois países, relativo ao reconhecimento de empresas, e conceder benefícios, quer dizer, facilitar o comércio e entrada de empresas certificadas, a gente tem de conhecer as empresas de ambos os lados. Então, por exemplo, o Brasil tem um acordo com o Uruguai e o Uruguai enviaria para nós uma lista de empresas. Nós enviaríamos nossa lista de empresas para eles. Ocorre que realizar essa troca de informações via e-mail não é adequado. Porque é preciso uma série de definições prévias: que informações trocaremos? Em qual formato? Preenchendo quais campos? E, depois, como atualizaremos essas informações? Então, o que ocorre, muitas vezes, é que, como só se conta com e-mails, existem os acordos de trocas de informações, mas eles acabam não funcionando, não saem do papel, e cada aduana faz a verificação por sua conta. Mas isso não é um problema só do Brasil, ou do Mercosul, é um desafio clássico de todas as aduanas”, destaca.

Para isso, segundo ele, blockchain é essencial pois como os ‘formulários’ serão compartilhados é preciso garantir que a informação não seja alterada e garantir também a autenticidade daquilo que está sendo compartilhado.

“Nossa tentativa com o bConnect é ver se blockchain nos garante três coisas: em primeiro lugar, segurança. A segurança de que a informação com que estamos lidando não pode ser alterada indevidamente. Em segundo lugar, precisamos garantir o reconhecimento da identidade de quem está alimentando ou alterando o sistema. Ou seja, a ferramenta precisa assegurar que quem está colocando a informação é realmente o representante legal do Brasil, do Paraguai, do Uruguai, da Argentina. Em terceiro lugar temos a questão do custo: é baixo? Requer pouco investimento para criar e desenvolver? Então, se tivermos confirmação desses três pontos (é seguro; existe uma certificação da identidade do gestor da informação, e o custo desse projeto é baixo), então poderemos oferecer essa ferramenta para troca de informações, não só para o Mercosul, como para qualquer outro acordo comercial”

Ainda segundo o auditor da Receita Federal, blockchain também ajudará as nações a ‘confiarem’ uma nas outras pois, atualmente o processo de certificação digital é diferente em cada um dos países que acabam por não reconhecer os certificadores de outras nações.

“Por exemplo, aqui no Mercosul existe uma acordo de troca de informações para trânsito de mercadorias chamado Sistema de Trânsito Internacional Aduaneiro, o Sintia. Esse sistema foi desenvolvido pelo Uruguai, Paraguai, Argentina e Brasil, mas até hoje não conseguiu ser utilizado. Argentina e Paraguai exigem um sistema que é baseado em certificação digital. O Brasil, por sua vez, tem uma certificadora que não reconhece a certificadora da Argentina. Essa incompatibilidade de certificações digitais é uma questão que pode ser resolvida com a adoção do blockchain. Ele é baseado em contratos inteligentes assinados ao mesmo tempo. Na hora em que você assina um contrato, o próprio smart contract dentro do blockchain reconhece aquele certificado digital assinado por cada um dos membros. Ele identifica as partes, descartando a certificação digital, pois o reconhecimento da parte está embutido no próprio bloco.

Também temos o Indira, que utiliza VPN e web service. Tentamos convidar outros países a usar o Indira, mas encontramos problemas porque eles não participaram da definição, portanto, têm outras ideias de como deveria ser esse uso de VPN e web service. Se blockchain der certo para a troca de informações de operadores econômicos autorizados, poderemos propor a evolução do Indira para um Indira baseado em blockchain. Isso para os quatro países do Mercosul. E, depois que estiver funcionando, podemos propor para uso na troca de informações com outros blocos de países também.

Alencar também destacou que o bConnet não é específico para o Mercosul e pode ser utilizado no futuro em outros acordos comerciais entre nações com o Brasil.

“O bConnect está começando com os quatro países do Mercosul, mas não é nossa intenção que fique restrito a esses quatro atores. Os acordos de reconhecimento mútuo de operador econômico autorizado (ARMs) podem ser feitos bilateralmente, entre dois países; regionalmente, como no caso do Mercosul; ou, multirregional, uma região como o Mercosul acordando com a União Europeia, por exemplo. A gente pretende, depois, oferecer essa ferramenta para os outros acordos que tanto o Mercosul assinar quantos os países do Mercosul assinarem bilateralmente. Estamos fazendo um acordo com a Aliança do Pacífico, um outro grupo de países. E quando o fizermos proporemos o bConnect.

Já  Joaquim Pedro Oliveira, um dos profissionais do Serpro envolvidos no bConnect, ressalta três aspectos importantes para compreender a tecnologia envolvida no projeto:

BLOCKCHAIN: RASTREÁVEL COMO SUA CONTA BANCÁRIA
Conceito

Blockchain é uma base de dados compartilhada na qual são usados recursos de criptografia para garantir operações rastreáveis. Uma operação rastreável é aquela na qual se pode verificar quem fez a operação e como o dado mudou por conta dessa operação. Ao compartilhar informações relevantes, é essencial garantir que nenhuma das partes tenha possibilidade de alterar uma informação sem que a outra (ou outras) saiba.

Rastreabilidade

A lógica do blockchain é a mesma do que se chama livro-razão, em contabilidade. Que é, também, o modelo que orienta uma conta bancária: se o banco fizer um depósito indevido na sua conta-corrente, ele não vai lá e apaga o registro do depósito, para corrigir. Ele faz uma devolução do valor, e registra esse estorno. O histórico nunca é apagado, ele é sempre atualizado, e você consegue saber quem fez qual alteração, e quando. O blockchain é uma tecnologia que utiliza essa mesma lógica: nada pode ser apagado. E isso agrega muita confiabilidade.

Descentralização

No caso de uma conta bancária, é o Banco Central, na verdade, que garante a rastreabilidade. Já no caso do blockchain, todos os envolvidos fazem o papel de um “banco central”; ou seja, o controle é descentralizado. E isso é uma de suas características. Essa tecnologia foi criada para suportar sistemas monetários independentes, os bitcoins, mas logo se percebeu que seria possível, e vantajoso, aplicá-la em outros campos, como a área de instituições estatais. As operações  podem ser checadas por várias pessoas – cada operação pode e tem que ser verificada.

Como noticiou o Cointelegraph, no início de dezembro a Receita Federal ‘lançou’ oficialmente a consulta dos dados do CPF por meio de uma solução em blockchain construída com o Dataprev, chamada bCPF. O projeto piloto da solução foi lançado no ano passado e, entre outros parceiros contou com a participação do Conselho de Justiça Federal.

Agora o projeto foi ‘lançado’ oficialmente e está disponível para ser acessado, mas, neste primeiro momento, para órgãos públicos.

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