Plano da Sigma Lithium para driblar crise dos metais para baterias é continuar cavando

Ana Cabral, CEO da Sigma Lithium, durante o Bloomberg New Economy do B20 em São Paulo, em 23 de outubro de 2024

Após 22 anos de carreira no mercado financeiro que a levou de São Paulo a Nova York, Londres e Joanesburgo, Ana Cabral estava pronta para retomar o controle de sua agenda, passar tempo com os filhos e se tornar uma investidora.

Doze anos depois, suas viagens estão mais intensas do que nunca e ela se tornou uma das mais proeminentes executivas do setor de mineração, após assumir o comando de uma companhia que apoiou por meio de sua empresa de private equity A10 Investimentos.

Mesmo com a Sigma Lithium enfrentando um colapso no preço do metal usado em baterias de carros elétricos, ela promete manter o curso e até triplicar a produção com uma mensagem para os rivais e opositores: ela finalmente entendeu como lidar com o setor.

“A piada no setor é que eu sou a CEO temporária que está há mais tempo no cargo porque é muito difícil”, disse Cabral em uma entrevista em São Paulo. “Meus colegas daquela época já se foram. Eles se aposentaram, estão se mudando para outro lugar, estão fazendo outras coisas.”

Embora a Sigma esteja finalmente produzindo e enviando lítio para os principais mercados, como a China, Cabral está lutando contra a falta de prêmio para o seu produto, o que ela vê como concorrência “ilegal” de empresas que não respeitam direitos humanos e protocolos de segurança semelhantes, e a necessidade de garantir capital de longo prazo.

Declarações elevadas

A executiva, que tem fala acelerada e está na casa dos 50 anos, é propensa a fazer declarações grandiosas, incluindo sua alegação de produzir “lítio verde quíntuplo zero”, sem resíduos e com a “operação mais eficiente do mundo em termos de água”.

As atividades de mineração da Sigma alteraram a paisagem do Vale do Jequitinhonha, uma empobrecida região do estado de Minas Gerais, mas ela insiste que a comunidade é solidária e está em melhor situação devido aos empregos, investimentos e programas sociais que ajudaram a compensar a poeira e o barulho das explosões controladas.

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A Sigma não foi a primeira produtora de lítio no Brasil, mas ajudou a impulsionar o setor no país. E Cabral é a maior defensora da bandeira da mineração, trabalhando para obter o apoio dos órgãos reguladores, autoridades governamentais e legisladores.

No LinkedIn, ela frequentemente publica comentários sobre o setor, elogiando tanto funcionários do governo quanto empresas rivais. Seu feed está repleto de clipes e fotos de sua agenda vertiginosa de eventos e painéis de discussão em todo o mundo.

Embora elogiada pelo setor de mineração do Brasil, cuja imagem foi manchada por dois desastres fatais com barragens, Cabral tem seus críticos.

“Não há nada de especial na planta”, disse Klemens Laschefski, geógrafo e professor da Universidade Federal de Minas Gerais, que visitou as operações da Sigma em Araçuaí e fez parte de um documentário. A Sigma parece ser “um produto especulativo que pretendem vender a um preço mais alto. É por isso que estão fazendo marketing ESG, tudo o que o investidor moderno quer ouvir”.

Em resposta, um porta-voz da Sigma disse que a A10 Investimentos, empresa de private equity que Cabral ajudou a fundar, é proprietária da Sigma há mais de uma década, o que dificilmente a torna um investimento “especulativo”.

Enquanto o Brasil se prepara para sediar a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas no próximo ano, a missão de Cabral complementa as tentativas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de posicionar o país na vanguarda da transição energética e das soluções climáticas, ao mesmo tempo em que se recusa a escolher lados entre as superpotências globais.

Um sinal do apoio do governo veio há alguns meses na forma de um empréstimo de 16 anos, no valor de R$ 487 milhões (US$ 84 milhões), do fundo climático do Banco Nacional de Desenvolvimento, o BNDES, para financiar a expansão da Sigma. O apoio é essencial, insiste Cabral, para dar competitividade à empresa.

Caminho sinuoso

A trajetória de Cabral, de banqueira de mercados de capital em instituições como Merrill Lynch, Goldman Sachs Group e Credit Suisse a CEO da Lithium, não foi linear.

Nascida no Rio de Janeiro, ela trabalhou no antigo banco de investimentos do bilionário Jorge Paulo Lemann, o Banco Garantia, no início dos anos 90, antes de ir para o rival Pactual. Em seguida, passou mais de uma década em Nova York e Londres antes de voltar para casa.

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“Você começa a pensar para onde vai em seguida”, disse ela. “É uma espécie de pirâmide, certo? Então, ficou claro para mim que eu não seria a CEO do Goldman Sachs.”

Ela fundou a empresa de private equity A10 Investimentos em São Paulo com seu amigo de longa data e veterano em finanças Marcelo Paiva em 2013. Depois de se concentrar inicialmente em consultoria de fusões e aquisições, eles identificaram o lítio como um investimento promissor.

Seu ex-marido e ex-co-CEO, Calvyn Gardner, tinha experiência em mineração, enquanto ela trazia conhecimento financeiro. Na época em que estavam procurando outros investidores e capital para o projeto, uma barragem de rejeitos operada pela gigante do minério de ferro Vale SA se rompeu, desencadeando um desastre ambiental mortal que afetou drasticamente o apetite para apoiar as atividades de mineração na época.

Destemida, Cabral se lembra de pedir à mãe que cuidasse dos filhos por algumas semanas em 2016, enquanto ela ia à Austrália e à China para estudar o setor. Ela acabou ficando nove semanas e voltou mais convencida do que nunca.

A melhor coisa

“Eu disse ao comitê de investimentos: ‘Essa será realmente a melhor coisa que faremos ou devo estar cega’”, disse ela. “Porque na Ásia é como se eles estivessem vivendo em um futuro que ainda não chegou aqui.”

Depois de listar a Sigma no Canadá em 2018 e, posteriormente, na Nasdaq, as ações da empresa foram supervalorizadas durante a pandemia. As ações subiram mais de 5.000%, atingindo um pico de capitalização de mercado de US$ 4,5 bilhões em maio de 2023. Nesse nível, sua participação a teria tornado bilionária.

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Após anos de estudos geológicos e de viabilidade, a mina Grota do Cirilo estava se preparando para finalmente iniciar a produção. Naquela época, a Sigma contratou o Bank of America para realizar uma revisão estratégica, e a empresa disse que havia recebido manifestações de interesse de empresas dos setores de energia, automóveis e baterias.

Com o aumento da expectativa de uma venda, as ações subiram.

Ao mesmo tempo, o casamento de Cabral com Gardner havia se desfeito e o que começou como um processo de divórcio privado tornou-se cada vez mais público. Gardner deixou o cargo de co-CEO em janeiro de 2023, e Cabral diz que a separação foi difícil em nível pessoal, mas não teve impacto sobre os negócios.

Como o preço do lítio começou a despencar em 2023, as ações da Sigma também caíram e não houve acordo para a empresa. As ações de empresas de lítio continuaram a definhar, pois o excesso de oferta superou a demanda dos fabricantes de baterias em meio à desaceleração das vendas de veículos elétricos. Os analistas esperam que o mercado do metal permaneça em um excedente nos próximos anos.

Escalada do custo

A Sigma registrou este mês seu quarto prejuízo trimestral consecutivo, pois a receita ficou abaixo das estimativas dos analistas, mesmo com o aumento da produção. As ações da empresa caíram cerca de 54% este ano.

Joel Jackson, analista da BMO Capital Markets, disse que a conclusão das duas próximas fases da mina pode levar mais tempo do que o esperado, com possível aumento de custos. Ele também não vê nenhum benefício real em termos de preço para os esforços da empresa em promover suas credenciais sustentáveis e os aspectos de rastreabilidade do produto.

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“A Sigma tem muito orgulho da qualidade de seu produto e das diferentes métricas de sustentabilidade que ela cita que seu produto oferece”, disse Jackson, que tem uma recomendação compra para as ações. “Mas ainda não vemos nenhum prêmio no mercado neste momento para essas métricas.”

Em seu relatório de 2023, o Serviço Geológico dos EUA classificou o Brasil em quinto lugar no mundo em produção de lítio, com um aumento de 86% em relação ao ano anterior, em grande parte devido à Sigma. O país está em sétimo lugar em reservas.

Em março, Cabral recebeu uma premiação no Brasil por seu destaque entre mulheres no mundo dos negócios. O prêmio foi entregue pelo bilionário Rubens Ometto, proprietário da Cosan, gigante do etanol e da logística, e ex-cliente de Cabral nos tempos no setor financeiro. Parte de seu discurso citou referências do filme Barbie para destacar os desafios que ela e outras mulheres nos negócios enfrentam.

“Precisamos ser bonitas, mas não muito bonitas. Podemos ser chefes, mas não podemos ser duras demais”, disse ela na cerimônia de premiação. “Apesar de sermos bem-sucedidas, somos constantemente subestimadas por pessoas que não nos conhecem. É literalmente impossível atender às expectativas que nos são impostas como mulheres.”

Cabral disse que, até 2027, quando a expansão da mina deverá estar concluída, ela poderia se ver permanecendo como investidora, mas não necessariamente liderando a empresa. Quando perguntada se administrar a Sigma tem sido mais fácil do que sua vida agitada como banqueira de investimentos, Cabral zombou.

“Definitivamente, não”, disse ela. “Será que planejo passar os próximos 10 anos assim? Bem, acho que não vou conseguir. Acho que vou entrar em colapso de alguma forma. Mas isso significa que tenho que vender a empresa? Absolutamente não.”

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