Para frear crise, Argentina força pessoas a gastarem Bitcoins e outros ativos antes de usarem dólares
O Banco Central da Argentina (BCRA) emitiu uma resolução na quinta-feira (28) paras as instituições financeiras obrigarem os seus clientes a declarar quaisquer ativos conversíveis em moeda estrangeira, incluindo as criptomoedas. A medida é para evitar a evasão de dólares existentes no país.
Com o comunicado, o governo argentino colocou o Bitcoin e outras criptomoedas no mesmo patamar que o ouro, investimentos em títulos públicos externos, fundos em contas de investimento em administradoras de investimentos sediados no exterior e fundos de contas prestadores de serviços de pagamento.
O Governo mencionou que esses “ativos externos líquidos” permitem a disponibilidade imediata de moeda estrangeira, nesse caso o dólar:
“Os ativos externos líquidos serão considerados, entre outros: detenções de notas e moedas em moeda estrangeira, disponibilidades em moedas de ouro ou em boas barras de entrega, depósitos à vista em entidades financeiras estrangeiras e outros investimentos que permitem disponibilidade imediata de moeda estrangeira”.
Franco Amati, Co-fundador da ONG Bitcoin Argentina, chegou a postar em seu Twitter a resolução do Banco Central afirmando que:
“Agora você não pode fazer transferências eletrônicas no exterior (use o “mercado de câmbios”) se tiver moedas digitais (“criptomoedas”). Você precisará vendê-los primeiro”.
Argentina, Bitcoin e uma crise cambial
Amati disse ao Portal do Bitcoin que o governo visa evitar a evasão de dólares e para isso a “pessoa deverá usar quaisquer ativos líquidos que possua” antes de usar dólares existentes no país.
“Os Bancos Centrais não gostam de gastar seus dólares. Então, o governo quer que antes de dispersar os dólares que as pessoas utilizem outros ativos como Bitcoin, Ethereum, ouro, prata e até mesmo os saldos no PayPal. Pedir dólares ao Banco Central tem de ser a última coisa a ser efetuada por instituições”.
Segundo Amati, isso pode “limitar o uso de Bitcoins e Stablecoins por parte de grandes empresas”, as quais têm de registrar formalmente as criptomoedas que estão sob seu poder.
Embora a medida seja voltada para as empresas, as pessoas também serão afetadas, conforme explicou Amati:
“Afeta mais as empresas por que são elas que geralmente devem pagar os provedores no exterior. Mas também afetar indivíduos, pois eles devem buscar fornecedores no exterior com valores superiores a US$ 200”.
Bitcoin e a alta do dólar na Argentina
A advogada Daiana Gomes Banegas, que atua como Legaltech na plataforma argentina de Blockchain Signatura, afirmou que o Bitcoin tem colaborado com a alta do dólar em relação ao peso argentino.
“Pessoas têm trocado Bitcoins no mercado negro por pesos argentinos e depois comprado dólares nos preços oficiais”, disse Banegas.
Parte desses Bitcoins, no entanto, é comprado “no mercado negro ou em outros locais que não sejam bancos oficiais”. A realidade hoje experimentada pela Argentina é de falta de confiança em sua moeda.
O governo, então, decidiu proteger a economia interna do país que passa por um momento de incerteza com o coronavírus. A situação monetária e cambial da Argentina, que já não vinha bem antes, piorou com a pandemia:
“Todas essas restrições sobre os mercados de divisas vieram após as eleições presidenciais. Agora é o pior momento com as mudanças governamentais. Temos muitas dúvidas sobre os fundos internacionais. De fato estamos em crise novamente que foi piorada após a Coronavírus”.
Dólar valorizado no mercado negro
Banegas disse que existem cotações diversas para o dólar a depender do seu uso. Se é para turismo, a moeda americana terá um valor diferente daquele que é negociado no câmbio paralelo, como ocorre também no Brasil. A preocupação, porém, da Argentina é quanto ao valor do dólar blue o qual pode ser negociado no mercado negro.
“O preço oficial do dólar blue ataca a liquidez de bancos em dólares, caso haja diferença entre preços de dólares a serem pagos por empresas dentro da Argentina e por bancos internacionais”.
Diante disso, o Bitcoin não é o foco do governo. Mesmo que recentemente a Argentina tenha deixado claro sua vontade de fiscalizar quem negocia criptomoedas sob a justificativa de evitar lavagem de dinheiro, a questão agora é outra: “O preço do dólar no mercado negro tem aumentado dia após dia”.
Solução argentina
A resolução, explicou a advogada, visa então assegurar que pessoas que possuem criptomoedas ou dólares passe a vendê-los no mercado oficial com preço oficial para que a diferença entre os preços nos mercados oficial e negro pare de aumentar.
“Isso não é algo contra a venda de Bitcoin, mas sim uma medida protetiva para manter os dólares aqui”.
O governo argentino reconhece que o uso do Bitcoin é válido em negociações internacionais. Ele é “uma forma válida de fazer pagamento, se houver uma combinação entre operadores para celebrar obrigações fora da Argentina. Isso é um bom sinal para a comunidade cripto em geral, mesmo quando há pagamento de tributos”, disse a advogada.
Crise econômica crescente
Alexandre Vasarhelyi, co-responsável pela gestão dos fundos de Cripto Ativos da BLP Asset, concordou com Banegas sobre a crise. O cenário, de acordo com ele é de que “a Argentina caminha para a dificuldade máxima e o governo como resposta vai dificultando o acesso ao dólar”.
Na visão de Vasarhelyi, o problema todo começou com a “pré-eleição onde ficou claro que os peronistas iam voltar ao poder”. Ele defendeu que o ex-presidente da Argentina Maurício Macri “vinha segurando o câmbio de todas as maneiras”.
Valor reconhecido do Bitcoin
Vasarhelyi acusou, então, o novo governo do presidente Alberto Fernández criar impedimentos para a pessoa atuar no mercado de câmbio. Ele disse que não existe ágio para uma moeda conversível.
“Uma moeda que é conversível não existe ágio. O Bitcoin é o ativo que evidencia a dificuldade de se converter uma moeda. A argentina caminha para a dificuldade máxima. Lá em um ágio de 85% mostra um mercado de câmbio disfuncional”.
Isso, porém, tem um lado positivo para as criptomoedas. Assim como Banegas e Amati, Vasarhelyi declarou que o governo da Argentina reconhece a importância das criptomoedas em sua economia.
“O Banco Central da Argentina está reconhecendo a potência dos criptoativos e coloca oficialmente o Bitcoin ao lado do outro, títulos do tesouro americano. Para o Bitcoin é uma vitória como percepção de status e importância”.
*Colaborou Cláudio Goldberg Rabin
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