Sem donos: 4 redes sociais da Web3 que transferem o poder e as receitas aos usuários

Proposta de compra do Twitter por Elon Musk reacende debate sobre descentralização de redes sociais como alternativa mais efetiva para garantir liberdade de expressão e poder aos usuários.

Elon Musk justificou sua proposta de compra do Twitter como um movimento necessário de “redemocratização” da popular rede social para garantir os direitos de liberdade de expressão de todo e qualquer indivíduo, independentemente de suas posições particulares. Mas até agora o efeito mais óbvio do novo objeto de desejo do bilionário foi evidenciar a profunda divisão em que a sociedade norte-americana está mergulhada. 

O Crypto Twitter, naturalmente, mobilizou-se em torno da discussão. O criador do Ethereum (ETH), Vitalik Buterin, manifestou suas reservas ao “entusiasmo generalizado em torno do fato de pessoas/organizações ricas tomarem o controle de forma hostil de empresas de mídia social.”

Não me oponho a Elon comandando o twitter (pelo menos em comparação com o status quo), mas eu discordo do entusiasmo generalizado por pessoas/organizações ricas que de forma hostil tomam o controle de empresas de mídia social. Isso poderia facilmente dar *muito* errado (por exemplo, imagine um governo estrangeiro eticamente desafiado fazendo isso)

— vitalik.eth (@VitalikButerin)

O bitcoiner e candidato ao senado pelo estado de New Hampshire, Bruce Fenton, considerou a proposta e a justificativa de Musk “uma das melhores coisas que poderiam acontecer aos mercados norte-americanos”.

Por que as notícias do Elon/Twitter são uma das melhores coisas que podemos ver acontecer nos mercados americanos.

Um thread

1/ Hoje, Elon Musk anunciou uma oferta hostil de aquisição de 100% do Twitter e mencionou especificamente a liberdade de expressão em seu requerimento na SEC

2/ A América corporativa, especificamente a big tech e a grande mídia, têm tomado cada vez mais decisões terríveis para os acionistas e abandonaram missões centrais de boas empresas em um esforço para apaziguar um contingente marginal de ativistas despertos.

Isso deve ser encaminhado de forma correta e este é o caminho.

— Bruce Fenton (@brucefenton)

Ari Paul, fundador da Block Tower Capital mostrou descrença na possibilidade de que capitalistas possam garantir a liberdade de expressão e a resistência à censura ao tornarem privada uma companhia pública até então.

O Twitter é uma empresa centralizada com fins lucrativos. Isso significa que, como quase todas entidades desse tipo, tornou-se mais “fechada” ao longo do tempo (removendo APIs abertas, etc.). As empresas são adquiridas, privatizadas etc. Apenas coisas do capitalismo. Quem pensa que isso é um caminho para a descentralização…/1

2/ não está prestando atenção. Você pode olhar basicamente para qualquer coisa que Dorsey ou Musk já tenham tocado (ou quase qualquer empresa que já existiu). Não teremos resistência à censura ou “liberdade” como um “presente” de um capitalista. Conseguiremos isso construindo alternativas.

— Ari Paul (@AriDavidPaul)

Nesta mesma linha, o colunista da Bloomberg, Matt Levine ironizou a proposta de tornar “a praça pública privada em um ambiente privado.”

Correndo o risco de ser levado muito a sério, direi que é meio estranho para o homem mais rico do mundo afirmar que  “esta é a praça pública, vou transformá-la em um espaço privado”. 

— Matt Levine (@matt_levine)

Sam Bankman-Fried foi uma das raras personalidades públicas que adotou uma reação moderada e menos emocional à proposta de Musk. Em um exercício de imaginação, o CEO e fundador da exchange FTX compartilhou algumas ideias sobre como transformar o Twitter em uma rede social descentralizada.

2) Os tweets ficam on-chain, criptografados; o remetente escolhe quem tem acesso a eles (ou seja, quem pode descriptografar). De certa forma, isso unifica DMs e tweets – DMs são apenas tweets com a configuração de privacidade de “somente Jill”.

3) A monetização vem de duas formas:

a) nível de tweet; o protocolo subjacente cobra algo por mensagem. Com ~500 milhões de tweets/dia, US$ 0,01/tweet substituiria metade da receita do Twitter; US$ 0,001/tweet substituiria seu lucro.

b) nível de UI; a interface do usuário também pode gerar receita.

— SBF (@SBF_FTX)

A verdade é que já existem algumas iniciativas nesse sentido sendo desenvolvidas na indústria de criptomoedas. O principal propósito por trás de redes sociais descentralizadas baseia-se na transferência da propriedade a produção criativa e intelectual aos criadores de conteúdo, promovendo novos modelos de distribuição, monetização e engajamento através de dapps (aplicativos descentralizados) NFTs e DAOs (organizações autônomas descentralizadas).

A seguir, o Cointelegraph Brasil apresenta algumas das iniciativas mais interessantes e em estágio mais avançado de desenvolvimento de redesenhar o design e a lógica das redes sociais sob as diretrizes de descentralização e de distribuição de poder e receitas aos usuários da Web3.

Lens Protocol

Idealizada pelos mesmos desenvolvedores do protocolo de empréstimos Aave, o Lens Protocol é uma plataforma que fornece o substrato para que desenvolvedores criem redes sociais cripto-nativas, sem a necessidade de criar uma base de usuários do zero.

Uma base de usuários consistente é fundamental para o sucesso e a sustentabilidade de uma rede social, uma vez que em uma plataforma clássica da Web 2.0, como o Facebook e o Instagram, caso o usuário decida abandoná-las, todo o conteúdo produzido fica off-line e inacessível. Ao migrar para uma nova plataforma, os usuários terão que reconstruir do zero todo o conteúdo e as conexões perdidas.

No Lens Protocol, qualquer aplicativo construído com base na plataforma expande o que os desenvolvedores chamam de “gráfico social” e beneficia toda a cadeia de aplicações e de usuários que já utilizam o ecossistema, permitindo que eles se conectem aos novos serviços.

Por enquanto, o Lens Protocol está disponível apenas na Mumbai, uma rede de testes da Polygon (MATIC), blockchain que foi escolhida para hospedar o protocolo por conta da velocidade de transação, taxas baixas e compatibilidade com o Ethereum. Por enquanto, o protocolo não possui token nativo, mas é muito provável que venha a ganhar um no futuro.

Os perfis do Lens Protocol serão certificados por NFTs. Dinâmicos, não custodiados e não permissionados, esses NFTs agregarão o histórico de todas as postagens, repostagens, comentários e outras formas de interação de seus proprietários.

Publicações individuais também poderão tornar-se colecionáveis e, consequentemente, negociáveis. Usuários que compartilharem conteúdos alheios, contribuindo para a sua popularização e engajamento, também serão recompensados caso o item seja negociado futuramente.

Outro recurso oferecido pelo Lens Protocol é a possibilidade de conversão de um perfil em uma DAO, caso este se torne extremamente popular. O Lens Protocol fornecerá os recursos de governança para que os participantes das organizações autônomas descentralizadas nascidas no protocolo possam geri-las.

DeSo

Apresentando-se como “a rede social descentralizada”, o DeSo é uma rede blockchain criada especificamente para hospedar aplicativos de mídia social descentralizados. 

Inclusive, a plataforma se aproveitou do debate que se seguiu à proposta de compra do Twitter por Elon Musk para apresentar-se ao antigo CEO da rede social, Jack Dorsey, como a solução de todos os problemas de redes sociais centralizadas, convidando-o para que Dorsey eventualmente possa contribuir com o desenvolvimento do protocolo. No entanto, a ideia não foi exatamente bem recebida pelo executivo.

O DeSo visa tornar os conteúdos produzidos pelos usuários de mídias sociais não permissionados e acessíveis a qualque usuário. Os desenvolvedores do protocolo o apresentam como um serviço de utilidade pública.

Ela planeja introduzir soluções financeiras P2P baseadas na emissão de social tokens. Esses tokens sociais, ou “moedas de criadores”, nada mais são do que tokens emitidos por produtores de conteúdo a partir da criação de um perfil em uma determinada rede social hospedada no protocolo. 

Os desenvolvedores do DeSo pretendem fazer das “moedas de criadores” uma nova classe de ativos diretamente vinculada à reputação dos indivíduo a que estão atrelados, e não a uma empresa ou produto. 

A ideia é que esses tokens possam se tornar a primeira ferramenta capaz de agregar valor a partir da “influência social” das personalidade subjacentes a eles. Se as pessoas entenderem esse princípio, então o valor desses tokens personalizados terá correlação direta com a popularidade das pessoas que eles representam, capacitando os criadores a monetizarem sua produção de formas nunca antes experimentadas.

Em apenas 1 ano desde o seu lançamento, a plataforma já conta com 1,5 milhão de usuários, executou 65 milhões de transações e gerou mais de US$ 26 milhões em receitas para os usuários dos aplicativos baseados na DeSo, segundo um comunicado divulgado na imprensa recentemente.

Superlocal 

O Superlocal pretende construir o Foursquare da Web3, incentivando os usuários a divulgarem seus lugares favoritos para serem recompensados com o token nativo da plataforma, o LOCAL, e NFTs.

Enquanto as principais redes sociais concentram seu foco em notícias, influenciadores e entretenimento, o Superlocal criou uma maneira de conectar os usuários recompensando-os por interações com pessoas e lugares reais.

A ideia por trás do projeto é incentivar os usuários a compartilhar experiências documentando suas próprias vidas, criando um senso de comunidade e pertencimento que pode ser transferido da vida real para o espaço virtual.

Para participar do Superlocal, basta baixar o aplicativo e fazer um cadastro. A partir daí os usuários estão aptos para tirar fotos dos lugares por onde transitam, fazendo o check-in através do aplicativo.

As postagens passam por uma triagem e, em caso de aprovação, são publicadas. É preciso cumprir certos requisitos técnicos e estéticos para ter maiores chances de ter seu material aprovado e publicado.

A plataforma também utiliza NFTs para potencializar os ganhos dos usuários e ao mesmo tempo fortalecer os vínculos entre a comunidade. Os usuários podem mintar um NFT da coleção Locatrotter por 0,04 ETH (aproximadamente R$ 615) para ter acesso a benefícios exclusivos. Entre eles um bônus de 5% em LOCAL por check-in publicado.

Outra opção é mintar o que é chamado de NFT Mayorship por 0,07 ETH (aproximadamente R$ 1.080). Esta modalidade de token não fungível permite que os usuários colecionem lugares reais na plataforma, como seu restaurante ou praia favorita, por exemplo. Sempre que algum usuário faz check-in em algum desses lugares, o detentor do NFT Mayorship é recompensado.

Coinbase NFT

Na quarta-feira, 20, a Coinbase lançou a versão beta de seu aguardado marketplace de NFTs. Embora esteja disponível apenas para usuários dos EUA, os primeiros comentários a respeito da nova plataforma dão conta de que o Coinbase NFT vai além de ser apenas um espaço para negociação de tokens não fungíveis.

A interface de usuário da plataforma replica diversos recursos de aplicativos de mídias sociais. Na verdade, a intenção de incorporar ferramentas de engajamento social era algo que já havia sido publicamente declarado pela empresa.

De acordo com uma reportagem da Fast Company publicada na quarta-feira, 20, a plataforma claramente remete ao Instagram. Os usuários que se inscrevem na plataforma devem criar uma página de perfil sobre um fundo branco adicionando dados pessoais como nome, identificação de usuário e um avatar que ficam dispostos na parte de cima da tela, jungo com o número de seguidores do perfil. Logo abaixo, há um conjunto de imagens dos NFTs importados da carteira digital do usuário. 

O site possui uma guia identificada como “Descobrir”, que funciona exatamente como um feed e permite que os usuários naveguem por infinitas imagens de diferentes coleções de NFTs curadas por algoritmos, de acordo com as suas preferências pessoais.

Os usuários da plataforma podem comentar, ver quem é o dono dos NFTs, avaliá-los favorável ou desfavoravelmente, seguir contas alheias para acompanhar as coleções de NFT de usuários específicos ou fazer uma curadoria personalizada de suas imagens favoritas, selecionando ou ocultando determinados NFTs. Ou seja, a plataforma oferece todos os recursos necessários para que os usuários se tornem influenciadores de NFTs.

No entanto, a Coinbase NFT tem um calcanhar de aquiles justamente no que diz respeito à centralização. Assim como o Instagram, no qual é claramente inspirada, haverá moderadores trabalhando para fazer com que os usuários se comportem de acordo com as diretrizes da empresa – e não da comunidade.

Em um comunicado oficial sobre o lançamento da plataforma, a vice-presidente de produtos da empresa afirmou que a Coinbase NFT permitirá qualquer tipo de manifestação que não viole expressamente as leis dos EUA:

“Algumas outras plataformas foram além disso e começaram a inserir sua própria perspectiva do que é certo e do que é errado. A Coinbase não fará isso. Nosso propósito é dar aos artistas e à comunidade a liberdade de se expressarem da maneira que julgarem ser a representação correta deles e de sua arte. Não estamos no negócio de julgar o que é certo e o que é errado, desde que se cumpram as leis do país.”

As reais intenções de Elon Musk em relação ao Twitter, provavelmente só serão descobertas caso o homem mais rico do mundo realmente concretize a compra da empresa. Até agora, além da defesa da liberdade de expressão e da adoção de um código aberto, Musk mencionou a intenção de combater postagens de golpens envolvendo criptomoedas.

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