Jovem troca emprego por NFTs e acumula R$ 110 milhões com cards digitais de basquete
Em setembro de 2020, um jovem analista financeiro, de 31 anos, se deparou com uma novidade nas redes sociais que lhe chamou a atenção: o NBA Top Shot. Convicto de que aquilo poderia ser de alguma forma rentável, decidiu mergulhar de cabeça na plataforma e investiu 175 mil dólares para montar sua coleção de NFTs de basquete. Menos de seis meses depois, ela é avaliada em quase 20 milhões de dólares (cerca de 110 milhões de reais).
Para quem vê de fora, pode parecer loucura gastar dinheiro com cards digitais de basquete, que incluem, como nos tradicionais cards colecionáveis de papel, uma jogada marcante e estatisticas sobre o jogador e a partida, tudo disponível gratuitamente na internet. Mas a “febre” dos NFTs mostra que essa é uma visão apenas parcial sobre o universo dos colecionáveis em blockchain.
“Se alguém me disser que não vê o valor de diamantes, arte, selos, cartões físicos, esses itens intangíveis que não têm valor intrínseco, será impossível fazê-los cruzar a linha em um ativo digital”, disse Michael Levy, o jovem que fez fortuna como um dos primeiros a apostar na plataforma da liga norte-americana de basquete, em entrevista ao Wall Street Journal.
Para entender mais facilmente, diz Levy, é interessante usar como referência outro tipo de colecionador, como dos cards esportivos físicos, aqueles de papel, bastante populares nos EUA, sejam de basquete, beisebol ou futebol americano. Eles custam alguns poucos centavos de tinta e papel, mas os mais valiosos têm tiragem limitada, refletem uma experiência e vêm com garantia de autenticidade. Os cards digitais do NBA Top Shot e de outras plataformas de NFTs colecionáveis ligados aos esportes, como a Sorare, têm as mesmas características.
“É a história, a escassez, a alegria que você obtém como colecionador”, disse Levy ao WSJ. “Não é sobre a capacidade de segurá-lo em suas mãos”, explica, em referência ao argumento de que os “NFTs não têm valor por não serem palpáveis”, bastante usado por quem não está acostumado ao mundo digitalizado das novas gerações.
Os NFTs — sigla em inglês para “tokens não-fungíveis” — usam a tecnologia blockchain para criar uma espécie de criptoativo que, diferentemente do bitcoin, é único (não existem dois iguais) e traz informações registradas em contratos inteligentes, como vídeo, foto, desenho, áudio, certificado de autenticidade e outros dados relevantes.
Eles começaram a se tornar populares com um jogo chamado CryptoKitties, criado em 2017 pela Dapper Labs — a mesma empresa por trás do NBA Top Shots —, em que um algoritmo cria representações de gatinhos, com caracteristicas que variam entre si, como cor, raça, cor dos olhos, acessórios e outros detalhes. Cada gatinho é um token, e, dependendo da raridade da combinação, o gatinho digital poderia ser negociado a algumas dezenas de milhares de dólares.
Depois de grande sucesso na época do seu lançamento, o interesse pelo CryptoKitties esfriou — apesar de ainda estar ativo — e foram necessários mais de dois anos até que artistas e grandes marcas percebessem o potencial dessa tecnologia. Surgiu, então, um mercado multimilionário de arte digital, de colecionáveis e, como qualquer pessoa pode emitir um NFT, até até de tweets e memes.
Fundador do Twitter, Jack Dorsey “tokenizou” seu primeiro tweet em um NFT e o colocou em leilão, cujo maior lance já está em 2,5 milhões de dólares. Artistas da música e das artes visuais têm vendido suas obras digitalizadas e certificadas com o uso da tecnologia e também movimentam cifras milionárias.
Já o NBA Top Shot passa de 200 mil usuários ativos e mais de 350 milhões de dólares transacionados, sendo 250 milhões no último mês e um recorde de quase 40 milhões de dólares em um único dia — a empresa cobra 5% de taxa por transação, o que dá uma dimensão do sucesso da empreitada. “Sabíamos que era algo explosivo”, disse Roham Gharegozlou, executivo-chefe da Dapper Labs, ao WSJ. “O que nos surpreendeu foi a rapidez com que os principais influenciadores do basquete o adotaram.”
A plataforma de colecionáveis da liga norte-americana de basquete é um caso emblemático porque é, atualmente, a mais popular e que movimenta cifras mais altas. Mas está longe de ser a única. Na Sorare, que tem um produto semelhante, porém ligado ao futebol e com parceria com alguns dos maiores times do mundo, o cenário é parecido — recentemente, um NFT com a imagem de Cristiano Ronaldo foi negociado a mais de 100 mil dólares na plataforma.
Assim, Michael Levy é apenas um entre vários jovens que apostaram nesse formato e agora guardam fortunas em NFTs. Tokens da plataforma da NBA que eram negociados a menos de 10 dólares em janeiro, agora valem centenas ou até milhares de dólares — um NFT de Lebron James foi vendido recentemente por mais de 200 mil dólares. E a ideia de que além de divertida, a negociação desses ativos digitais pode ser rentável, têm atraído multidões.
A maioria deles é jovem e, entre os que entraram cedo e agora estão ricos, quase todos têm características em comum: encontraram um mercado inexplorado, viram ali uma oportunidade antes do resto do mundo e, como tinham conhecimento de basquete, de blockchain e dinheiro para investir, assumiram o risco, que, até agora, tem valido a pena.
Por outro lado, as semelhanças com uma bolha financeira chamam atenção. É um mercado especulativo e, claro, existe risco considerável e uma série de variáveis que podem fazer o movimento perder força, os preços despencarem, e os investimentos serem perdidos. “Se isso acontecesse, eu ficaria na mesma posição de muitos jovens de 27 anos dos Estados Unidos”, finalizou, em referência a ter que voltar ao seu antigo emprego.