Bitcoins de herança: como o Brasil e o mundo lidam com o patrimônio digital

Com a revolução digital dos últimos 20 anos, as leis não conseguiram acompanhar as mudanças da sociedade. Como proteger seus BTCs?

A revolução digital transformou os ambientes virtuais e físicos, agregando valor sobre produtos e itens que só existem “na nuvem”, ou nas redes, entre eles as criptomoedas e o Bitcoin.

Mesmo que nos últimos 20 anos o mundo tenha mudado radicalmente, a maioria das leis não conseguiu acompanhar as revoluções de costumes e de procedimentos que tomaram a vida das populações.

Bilhões de pessoas ao redor do mundo agora têm suas identidades ligadas a perfis nas mais diversas redes sociais e aplicativos, além do patrimônio distribuído em carteiras de dinheiro e moedas digitais que só existem no ambiente digital.

A Lei Geral de Proteção de Dados, que entrou em vigor neste ano, busca proteger esses dados, mas ainda não é capaz de responder a uma questão importante: quando o dono de uma identidade digital morre, como lidar com os bens digitais de valor?

A pandemia trouxe ainda mais urgência a esta questão. Os bens e a herança digital não são regulamentados por lei, e além da LGPD, há também o Marco Civil da Internet, de 2014, que lida de forma superficial com o tema. Quatro projetos na Câmara dos Deputados tratam do tema, mas estão arquivados.

Por isso, a Justiça tem decidido, caso a caso, os procedimentos e interpretações sobre bens de valor virtuais.

No Blog do Fausto Macedo, do Estadão, os juristas Júlia Fernandes Guimarães e Eduardo Vital Chaves defendem em artigo a urgência de clareza regulatória:

“A regulamentação se faz necessária especialmente por haver a necessidade de tratar o conteúdo patrimonial, como também o resguardo de informações e dados personalíssimos (o chamado conteúdo existencial), cujo sigilo, o titular não gostaria de ter violado.”

O artigo lembra como há casos de estudo no mundo sobre o tema. Nos Estados Unidos, desde 2015 foram estabelecidas regras para bens digitais, tanto pelo títular quanto em caso de falecimento.

Já na Europa, as leis ainda estão atrasadas. No Reino Unido, não há uma lei específica para bens e herança digital, mas a Corte Superior Britânica recoheceu a existência do Bitcoin como um bem digital passível de herança.

Na Alemanha, em 2018, a Justiça permitiu a uma família o acesso à conta pessoal do Facebook de uma filha falecida, abrindo um precedente legal para todo o bloco europeu. Mas há ressalvas:

“Destacamos, ainda, que dar aos herdeiros acesso ao conteúdo digital do falecido não implica permitir que as contas sejam utilizadas livremente, nem tampouco que as mensagens ou outros dados sejam divulgados, como ressaltou a decisão.”

No Brasil, a Justiça não tem encontrado uma norma. Cada caso até hoje foi analisado isoladamente, com decisões contra e a favor do acesso a bens e contas digitais de entes falecidos.

Os juristas dizem que, na ausência de regulamentação, uma das soluções seria estipular em testamento o acesso e transferência de bens eletrônicos, comunicando a vontade expressa de permitir ou não o acesso a estes bens. E completam:

“Advogados têm orientado seus clientes, quando da feitura de testamentos, quando cabível, a declarar manifestação de vontade quanto à manutenção de sigilo ou resguardo de informações dos titulares de contas eletrônicas. Mesmo assim, o testamento não subtrai a necessidade de as pessoas conversarem entre si sobre a existência de bens eletrônicos e a sua vontade de existir em redes sociais, após a sua morte.”

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