Gestora com retorno de 516% em 6 anos faz alerta sobre inflação nos EUA
Com 516% de rentabilidade desde que foi criado em março de 2015, o principal fundo da Forpus Capital acumula um histórico invejável. Sem nunca ter perdido sequer um ano para o Ibovespa, sua performance em meio às turbulências de 2020, 13 pontos percentuais superior ao índice, a tornou uma das gestoras mais procuradas pelo investidores, com sua base de cotistas quadriplicando no ano para cerca de 20.000.
Pouco antes de seu principal fundo fechar para captação, no início deste ano, o número de cotistas bateu em quase 30.000 investidores. A fórmula de sucesso tem sido a abordagem político-econômica para identificar os setores da bolsa que mais irão se beneficiar e se prejudicar com os cenários macroeconômicos.
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No atual cenário, a Forpus vê grande possibilidade de a inflação americana acelerar, apesar de o Federal Reserve (Fed, banco central americano) insistir em alegar que a alta de preços aos consumidores é apenas temporária.
“Aqui, o Banco Central passou um período negando a inflação. Agora, são os Estados Unidos”, disse disse Luiz Nunes, sócio-fundador da Forpus, em entrevista à EXAME Invest. “Vínhamos tendo dólar forte, juro baixo e inflação baixa e estamos indo para um ambiente totalmente antagônico.”
Sempre com uma parte do portfólio destinada à proteção, a Forpus tem buscado refúgio em ETFs (os chamados fundos de índice) do mercado americano, como o IVOL, TBT e PST, que se beneficiam da inflação dos Estados Unidos. Ações de empresas de commodities, como a Vale (VALE3), também já serviram de proteção, mas a gestora praticamente zerou sua posição, já que espera pela desvalorização do dólar.
Enquanto diminui a posição em commodities, a gestora aumenta em empresas de tecnologia, que vêm sofrendo fortes baixas, com temores sobre a redução dos estímulos monetários.
“Com esse movimento, começa a haver uma demanda por mais resultado. No Brasil, vai haver essa correção. Mas isso é uma oportunidade de compra.” Segundo Nunes, as empresas brasileiras de tecnologia devem ganhar o protagonismo no longo prazo e impulsionar a alta do Ibovespa nos próximos anos.
Outra aposta da Forpus visando um horizonte mais longo são os criptoativos. Mas a gestora prefere não escolher entre bitcoin e ethereum, e, sim, aplicar em um ETF diversificado, que é o HASH11.
“O blockchain pode ser o futuro. Tem um milhão de aplicabilidades que nem conseguimos saber qual é. Compramos o índice da Hashdax que se ajusta conforme os ativos vão ganhando ou perdendo relevância no mercado.”
Confira a entrevista de Luiz Nunes, da Forpus, à EXAME Invest.
A inflação americana tem sido o grande tema do mercado. O senhor acredita que ela veio para ficar?
Vínhamos tendo dólar forte, juro baixo e inflação baixa e estamos indo para um ambiente totalmente antagônico. O dólar tem se enfraquecido em relação às moedas mais fortes do mundo e também contra as mais fracas — e o real é um dos exemplos.
Geralmente, os Estados Unidos estão um tempo à frente do Brasil em questões econômicas, mas, neste caso, achamos que é o oposto. Aqui, o Banco Central passou um período negando a inflação. O IGP-M vinha a 3%, 5%,10% ao ano e diziam que era algo “passageiro”, até que passou de 30%.
Agora, são os Estados Unidos que estão negando ao dizer que as “pressões inflacionárias são passageiras”. Tem uma piada que diz que quando a bola começa a descer a ladeira é melhor correr e pará-la, porque se deixar acelerar, não pega nunca mais. Agora, o banco central vai ter que puxar o juro um pouco mais do que gostaria.
Esse é o maior risco para o Ibovespa?
O grande risco para a bolsa brasileira é a queda da bolsa americana baseada numa mudança da política monetária dos Estados Unidos.
Como a Forpus tem se protegido contra a inflação?
Vínhamos comprando proteção através de dois ETFs, o TBT e o PST. São ETFs relacionados às taxas de juros longas dos Estados Unidos. Como fazem [os membros do Fed] a negação com a taxa curta, a taxa longa começa a empinar.
Hoje temos um ETF chamado IVOL. Ele captura a variação da inflação de curtíssimo prazo, porque os Estados Unidos podem vender Treasuries [títulos públicos americanos] para reduzir o rendimento dos títulos, mas não podem vender tomate, tênis ou carro para reduzir a inflação. A inflação é algo que vai acontecer e precisávamos capturar isso.
Outra alternativa que fizemos foi comprar exportadoras de commodities brasileiras. Como subiu muito, deu uma proteção boa de curto prazo. Houve uma aberração de mercado que acontece por pouco tempo, que foi a alta simultânea de dólar e commodities.
A receita da Vale (VALE3), que é o preço do minério de ferro vezes a quantidade [produzida] vezes o dólar, veio uma porrada. Mas isso é corrigido pelo mercado e o dólar vem cedendo bastante. Commodities é uma maneira bem boa de se proteger da inflação
Um dos principais principais motivos da inflação americana é o enfraquecimento do câmbio deles. Isso faz com que o preço interno suba. Como é uma economia bastante importadora, isso também leva os preços internos a subirem. Então também temos put [opção de venda] de dólar contra real.
Temos visto ações de empresas de tecnologia sofrendo bastante, com o índice Nasdaq caindo quase sempre mais que o S&P 500 e o Dow Jones. É um momento ruim para estar comprado em empresas de tecnologia?
Os Estados Unidos tiveram uma fase muito prolongada de juro próximo de zero. Muitas empresas se viciaram em fazer captações, porque o dinheiro queimava na mão do investidor. Ficou até famosa a frase “cash is trash“ [dinheiro é lixo, em português]. A empresa não precisava dar lucro e tudo bem.
Com esse movimento de alta de juros devido à inflação, começa a haver uma demanda por mais resultado. E aí tem o rotation, que nada mais é que um “chega disso e vamos colocar dinheiro em empresas que dão lucro”.
No Brasil, vai ter essa correção. Mas isso é uma oportunidade de compra. Estamos em em um estágio muito anterior, o que é positivo. O S&P 500 subiu como uma parede praticamente nos últimos 10 anos. E foi puxado pela tecnologia. Isso ainda está para acontecer no Brasil.
Nosso índice, o Ibovespa, é um índice da idade da pedra, basicamente composto por commodities e grandes bancos, que são empresas que tem uma tecnologia baixíssima. Conseguimos ver uma substituição.
Aqui, uma empresa que automatiza o processo e demite uma pessoa consegue uma redução de custo muito maior do que nos Estados Unidos, devido aos maiores encargos trabalhistas. Elas conseguem economizar muito mais isso.
Pensando a curto prazo, o e-commerce deve sofrer com a maior circulação de pessoas?
Houve uma aceleração muito grande dos e-commerce na pandemia. Vai ter um período em que as pessoas vão trocar a compra pela internet pela compra em loja física., simplesmente para sair de casa, o que vai ser ruim para o comércio online. No momento, essa é a parte mais frágil do setor, mas acho que essas empresas são de longuíssimo prazo, são as empresas do futuro. Por isso, estamos vendo como uma oportunidade.
Ainda há espaço de alta para administradoras de shoppings, empresas mais ligadas ao varejo físico?
Sem dúvida. O varejo físico e as empresas de infraestrutura, como concessionárias de rodovias e aeroportos, vão se beneficiar muito. Prefiro as que apanharam muito mas não chegaram a ficar com sua receita zerada. Já empresas como CVC (CVCB3) e Time for Fun (SHOW3)… eu não teria tanta convicção da solvência delas. Acredito que shoppings, empresas de infraestrutura e varejo físico tendem a se recuperar de maneira mais saudável.
O senhor comentou dos bancos ao se referir ao “índice da idade da pedra”. Os bancos devem continuar perdendo valor de mercado e espaço no Ibovespa?
Acredito que sim para ambas as perguntas. Por exemplo, há quatro anos, a Cielo (CIEL3) estava sozinha no mercado local e valia 100x. Era uma empresa boa e nunca deixou de ser. Só que foi de 100x para 20x, simplesmente porque teve um ajuste de margem.
Não sei qual é a magnitude, mas é mais ou menos isso o que vai acontecer com os grandes bancos. Hoje, eles estão sendo atacados por uma série de startups, que são mais ágeis. E eles têm o custo das agências, que estão virando uma coisa que não serve para nada.
O Itaú (ITUB4) vai ficar menor que o Banco Inter (BIDI11)?
Provavelmente não. Eles vão adquirir empresas que vão reoxigenar o sistema. No fim das contas, ele é o grande portador de caixa do país. Mas provavelmente vai perder valor de mercado e ter que se reinventar, que é o que já estão fazendo. Ter comprado a XP foi nessa linha.
Os bancos de maneira nenhuma vão desaparecer, mas vão ter uma nova roupagem, um novo valor, uma nova agilidade. Vemos o BTG Pactual (BPAC11) investindo muito na parte de tecnologia. Provavelmente, o grande valor do BTG vai ser o BTG digital. O banco Modal, hoje, vale uma fração da corretora Modalmais, que é uma das empresas que abraçam toda essa renovação do setor brasileiro. Isso mostra um indicativo da direção para onde os bancos irão.
No começo do ano, tivemos interferência do governo na troca dos presidentes da Petrobras (PETR3; PETR4) e do Banco do Brasil (BBAS3). A Forpus está confortável para investir em estatais?
Há dois pontos: o primeiro é se o negócio é bom, que para nós é o que mais importa. E o segundo é se é ou não estatal. No caso da Petrobras, o [presidente Jair] Bolsonaro, fez a coisa certa, mas, como em 99% das vezes, da pior maneira possível.
O presidente da Petrobras deveria ter sido demitido porque quebrou uma promessa. O Tarcísio [de Freitas, ministro da Infraestrutura] ficou negociando com os caminhoneiros por meses para que não fizessem uma paralisação no meio da pandemia em troca de ter o prolongamento do preço do petróleo.
O presidente da Petrobras simplesmente ignorou essa tratativa e fez o aumento. Realmente ele deveria ter sido demitido. Só que o Bolsonaro fez isso em uma live no Facebook, de um jeito totalmente extraoficial, horroroso.
Na parte de estatais, estamos à beira de ver algo praticamente impossível de acontecer, que é a privatização da Eletrobras (ELET3; ELET6). Se isso acontecer, o governo Bolsonaro já foi vitorioso. Isso é uma pauta quase da minha idade (40 anos).
As interferências teóricas do governo nas estatais não são um problema que nos fazem evitar de investir nelas. Mas a maioria das estatais que são negociadas [na bolsa] não estão em negócios que vejo como um grande atrativo de investimento. Até temos um pouco de Petrobras, mas não é uma posição que adoramos — e o motivo é o negócio dela, e não se tem interferência ou não do governo.
Vocês ainda mantêm posição na Vale?
Nós tivemos bastante Vale, mas reduzimos para quase zero, porque acreditamos que daqui para a frente vamos ter um movimento bem acelerado da desvalorização do dólar e valorização do real. Isso acaba tendo um impacto relevante na receita da Vale. Então temos menos, mas ela foi há muito pouco tempo uma das nossas maiores posições. A Vale é, além de tudo, uma proteção contra a inflação.
O senhor comentou que CVC e Time for Fun são ações de que prefere ficar de fora. Mas, até pensando na valorização do real, vocês estão otimistas com Gol (GOLL4) e Azul (AZUL4)?
Dado o fato de a nossa convicção não ser muito grande para as aéreas, preferimos ficar de fora. Vamos ficar vendidos? De maneira nenhuma. Mas as encaixamos, mais ou menos, nesse padrão CVC.
Até pouco tempo, a moda era chamar empresas de unicórnio, agora é de camelo. Vou dar um exemplo. A Time for Fun pode ser um super camelo: tinha caixa, conseguiu cortar custos, ficou sem receita, mas está viva. Aí começa a vir um dinheiro e ela explode [na bolsa]. Isso pode acontecer, mas não temos como saber. Preferimos olhar como vão reagir a esse primeiro estímulo antes de colocar na carteira.
A Forpus investe em criptoativos por meio do HASH11. Qual é a tese de vocês sobre esse mercado?
Nossa tese de cripto é baseada em pílulas de humildade. Imagina que estamos em 1999 e está surgindo um negócio chamado internet. Se comprássemos as duas maiores empresas do mercado, que eram Yahoo! e AOL, fôssemos para uma ilha e voltássemos 20 anos depois, iríamos encontrar o pessoal usando Zoom e acessando sites no celular.
Pensaríamos “ficamos ricos”. Mas, quando fôssemos ver, ficamos pobre, porque embora tivéssemos acertado que a internet teria uma utilidade, apostamos nos cavalos errados.
Hoje, acreditamos que essa tecnologia de blockchain pode ser o futuro. Tem um milhão de aplicabilidades que nem conseguimos saber qual é. Então é melhor ter. E dado que não sei qual é o cavalo, em vez de comprar bitcoin, ethereum ou outra criptomoeda da moda, vamos comprar o índice da Hashdax que se ajusta conforme os ativos vão ganhando ou perdendo relevância no mercado. É a humildade de não saber qual é o cavalo, então compro a tese.
Quanto vocês consideram a quantia ideal de criptoativos para ter na carteira?
Não adianta comprar 100 reais. Se multiplicar por 100, vai dar 10.000 reais. É legal ter 10.000 reais? É, mas não muda a vida de ninguém. Se comprar um ativo que se valorizou 100 vezes e só comprou 100 reais, você vai ficar muito nervoso.
Mas se comprar um ativo que for para zero é melhor não ter colocado todo seu dinheiro. Então estimamos de 2% a 5% do patrimônio, que é um dinheiro que se multiplicar por 100 faz diferença. Só que se virar zero, perde 5%, o que obviamente não é legal, mas não destrói financeiramente e psicologicamente a pessoa.