Nobel de Economia critica criptomoedas e declara: ‘É importante que governos mantenham controle sobre a moeda em circulação ‘

Esther Duflo, autora do livro A economia dos pobres: uma nova visão da desigualdade, falou sobre criptomoedas, aumento da pobreza na pandemia e vacinação desigual entre ricos e pobres.

A Nobel de Economia, a francesa Esther Duflo, autora do livro “A economia dos pobres: uma nova visão da desigualdade” falou em entrevista ao Valor, sobre projetos de transferência de renda e alternativas de abordagens econômicas da pobreza.

Contrária às moedas complementares de uma economia local, Duflo disse que os governos precisam manter total controle sobre a circulação das moedas e que se sente bastante inquieta sobre as criptomoedas.

“É muito importante que os governos mantenham o controle sobre a moeda em circulação. Esses projetos, e ainda mais os esquemas que envolvem criptomoedas, me inquietam bastante, por sinal. Não é isso que leva ao sucesso de iniciativas locais, como cooperativas de crédito e de trocas. Aí, o que é difícil é organizar a ação coletiva. Há alguns sucessos e muitos fracassos. É preciso encontrar as boas condições para a cooperação em cada localidade, com suas especificidades.”

Ela complementa:

“Cada vilarejo, por exemplo, tem suas formas de ajuda mútua e a questão é encontrar os métodos de formalizar ou perenizar esses mecanismos. Mas isso não significa que se possa simplesmente deixar as pessoas se virarem sozinhas, como se esses mecanismos fossem substitutos para o auxílio econômico e a ação do Estado. Há limites para o que pode fazer uma comunidade, sobretudo nos momentos em que ocorre um choque que atinge a todos, seja um choque climático, que afeta uma região, ou a covid, que afeta o mundo inteiro. Nesses casos, é claramente necessário um aporte exterior. Não se pode confiar simplesmente nos mecanismos locais.”

Esther Duflo é codiretora do Laboratório de Ação contra a Pobreza Abdul Latif Jameel (J-Pal).

Por meio desse laboratório, são realizadas desde 2003 pesquisas sobre pobreza e desenvolvimento em diversos países, incluindo o Brasil.

Em 2019, a economista francesa recebeu o Prêmio Nobel de Economia por seu desenvolvimento, junto com dois outros economistas, do método de experimentos aleatórios controlados, que têm o objetivo de reproduzir para as disciplinas sociais, as possibilidades de controle de outras ciências.

A economista afirmou que a pandemia deixou mais pessoas na pobreza:

“O tamanho dos retrocessos com a pandemia é patente quando olhamos os dados do Banco Mundial. O mero número de pessoas que caíram em situação de pobreza foi de mais de 97 milhões no ano passado. Esse número vinha diminuindo havia mais de 30 anos e aumentou pela primeira vez em 2020.”

Ela disse que a distribuição desigual de vacinas entre países ricos e pobres poderá trazer sérias consequências e se disse pessimista com o cenário atual:

“Neste momento, tem dois fatores que me deixam bem mais pessimista. O primeiro é o quanto a pandemia continua durando, sobretudo por causa da falta de vacinação nos países pobres, o fato de que esses países foram completamente abandonados quando começou a vacinação. A duração continuada da pandemia os impede de avançarem na retomada da economia. E, em seguida, ela também faz com que certos fenômenos se instalem e amplifiquem e se tornem cada vez mais irreversíveis. Desses, o que me deixa mais preocupada é a “desescolarização”, ou seja, o fato de que crianças deixem de frequentar a escola. Em muitos países, faz quase 18 meses que as crianças não vão à escola. Para piorar, os planos de reabertura são muito desiguais.” 

Sobre a distribuição desigual de vacinas, ela afirmou:

“Não havia nenhum motivo para não fazer uma distribuição mais igualitária. Vemos que simplesmente esse não foi um objetivo colocado como prioridade. O ponto é que, caso as lideranças tivessem priorizado essa distribuição, o mundo tinha, sim, as instituições necessárias para conseguir resultados melhores.”

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