Diretor diz que Visa quer expandir serviços com criptomoedas e NFTs
A Visa é, possivelmente, a empresa do mercado financeiro “tradicional” com laços mais fortes com o mercado de criptoativos. A empresa já anunciou uma série de produtos ligados ao setor, tem parcerias com grandes marcas desta indústria e recentemente anunciou a compra do seu primeiro NFT. Mas onde a empresa pretende chegar? E como ela enxerga o futuro do mercado de cripto e blockchain?
Em entrevista exclusiva à EXAME, o head de criptoativos da Visa, Cuy Sheffield, contou sobre as perspectivas da empresa, explicou o processo de escolha e compra do primeiro NFT da companhia, falou sobre o futuro da relação entre a Visa e o mercado cripto, e muito mais. Segundo ele, o mercado cripto e blockchain está “apenas começando” e ressaltou o quanto isso é importante, já que os números já são expressivos, o crescimento é acelerado, e tudo isso mostra quanta coisa ainda pode acontecer.
Além de comparar o surgimento dos criptoativos com a criação dos primeiros e-commerces, Cuy falou que a Visa poderá permitir a liquidação de pagamentos na sua rede com novos ativos digitais – atualmente isso é possível com a stablecoin USDC -, disse que a empresa deverá comprar novos NFTs, disse que vê espaço para a descentralização e a intermediação conviverem no mesmo universo e garantiu: “Estamos comprometidos com o ecossistema dos criptoativos”.
Confira a entrevista com o especialista em criptoativos da Visa abaixo, na íntegra:
Future of Money: Nos últimos meses, vimos grandes empresas comprarem bitcoin. A Visa comprou um NFT. Por quê? E por que um CryptoPunk?
Cuy Sheffield: Temos explorado e acompanhado de perto o ecossistema de criptoativos e quando nos deparemos com os CryptoPunks, vimos ali o primeiro exemplo bem-sucedido, uma plataforma pioneira no setor de NFTs. Enxergamos os NFTs em uma intersecção entre comércio e cultura e queríamos entender como os NFTs funcionavam para que a gente possa ajudar os nossos clientes a participar das negociações com NFTs. Queríamos que a Visa tivesse a posse de um NFT icônico, então não pensamos nisso como um interesse da Visa em ter criptoativos ou NFTs no seu balanço patrimonial, mas em adquirir uma peça para o nosso acervo. A Visa existe há mais de 50 anos e desempenhou um papel importante na transformação do comércio, das lojas ao e-commerce, do dinheiro e do cheque aos cartões e carteiras digitais, e temos uma série de ítens no nosso arquivo que contam e celebram essa hsitória. Cartões de crédito de papel, máquinas manuais para registrar transações com cartões… então quisemos adicionar um CryptoPunk à nossa coleção para ajudar a celebrar a história do comércio, o seu passado e o seu presente, e possivelmente adicionaremos mais NFTs no futuro. Nosso objetivo não foi financeiro, como as empresas que compraram bitcoin, como a Tesla. Queremos ter um pedaço da história dos NFTs.
FoM: Qual o interesse da Visa no mercado de criptoativos de forma geral? A companhia acredita que esse setor poderá se tornar dominante como meio de pagamentos?
CS: Quando criamos a unidade de criptoativos em 2019, nosso primeiro objetivo era pensar em como a Visa poderia se tornar uma ponte entre as novas carteiras e corretoras de criptoativos e a nossa rede de 70 milhões de lojistas. Percebemos que as mudanças e o crescimento do mercado cripto acontecem muito rapidamente, com aumento de bilhões de dólares e milhares de criptoativos, mas ao mesmo tempo havia poucos lojistas aceitando pagamentos com ativos digitais de blockchains públicos. Então, como essas carteiras e corretoras queriam expandir sua oferta de serviços para pagamentos, fazia sentido para eles virem trabalhar com a Visa e emitir credenciais Visa, sejam físicas ou virtuais, e permitir que seus clientes pudessem fazer compras e pagamentos de forma simples, em uma rede de mais de 70 milhões de lojistas, usando suas criptomoedas ou stablecoins. Essa foi a nossa entrada no mercado cripto, e foi muito bem-sucedida, nos tornamos a rede preferida das carteiras para intermediar pagamentos com criptomoedas, e hoje temos mais de 50 carteiras de criptoativos parceiras e um volume de mais de 1 bilhão de dólares em pagamentos realizados. Essa foi a fase 1. Então começamos a evoluir para nos tornar uma ponte entre os clientes existentes, instituições financeiras, bancos, fintechs, e o ecossistema de criptoativos. E começamos a construir a plataforma Visa Crypto API para ajudar companhias que não são nativas no universo cripto a incorporar criptoativos aos seus serviços – cashback ou recompensas em bitcoin, por exemplo, ou a habilidade de negociar bitcoin. E aí vimos o crescimentos dos NFTs, e pensamos como a Visa poderia ser uma ponte entre os lojistas parceiros e as plataformas. Neste processo, comprar um CryptoPunk foi uma forma de entender o setor e se posicionar para que sejamos referência para os nossos parceiros que querem participar do mercado de NFTs.
FoM: A Visa tem uma parceria com a Circle para liquidar pagamentos com a stablecoin USDC. Existe perspectiva para incluir outros criptoativos a esta função?
CS: Anunciamos a parceria com a USDC no fim de 2020, para permitir que nossos clientes recebam pagamentos com USDC ao invés de transferências bancárias tradicionais. Ainda estamos nos estágios iniciais, testando essa função, e pretendemos adicionar outros ativos sim, mas vamos fazer um trabalho investigativo muito forte para entender quais ativos digitais os nossos clientes querem usar, e quais são realmente seguros. Em geral, stablecoins, que têm lastro, são mais reguladas e mais eficientes para este fim. Queremos apoiar o uso de criptoativos e da tecnologia blockchain, como nossos clientes exigem, e queremos ser essa ponte, essa rede de redes, onde podemos ajudar nossos clientes a mover valores na rede da Visa ou nesses novos blockchain públicos de stablecoins que temos visto surgir e crescer.
FoM: Você acredita que, por ter maior apelo com gerações mais novas, os criptoativos podem se tornar dominantes no futuro?
CS: Cripto está se tornando algo cultural, e claramente existem diferenças de interesse em diferentes gerações. E o setor se expandiu para várias areas diferentes, especialmente com NFTs, que deixou de ser aquela coisa de novas moedas, como o bitcoin. Agora, cripto é um espaço que engloba música, arte, mídia. Os NFTs trouxeram uma nova audiência, inclusive de criadores e pessoas que não estão necessariamente interessadas em finanças, mas têm interesse em cultura. Os NFTs são uma nova ferramenta para criadores venderem online, monetizar sua criatividade, e, para colecionadores, uma forma de interagir com outros colecionadores e com os próprios criadores. Uma das coisas legais do universo cripto é essa capacidade de impactar diferentes indústrias e se tornar algo divertido e com utilidade muito além de finanças e investimentos.
FoM: Um dos argumentos dos entusiastas dos criptoativos cita a descentralização como fator fundamental para sua atratividade. Como a Visa pretende contornar isso, já que a empresa é justamente uma intermediadora de pagamentos?
CS: Não vemos a descentralização como algo binário, mas como um espectro. Produtos e ferramentas cripto vão continuar existindo por todo esse espectro, que não é o único. Para as pessoas que querem guardar bitcoin em uma hardware wallet em que eles tenham total controle sobre os fundos, e que nunca interaja com outra parte, eles podem fazer isso, isso está disponível, como uma série de produtos nesse sentido. Mas, conforme o universo se torna mais popular, com consumidores novos neste espaço, é importante ser acessível, fácil de usar e interagir. No caso dos NFTs, é uma forma que acreditamos ser muito boa para ajudar artistas e criadores a monetizar e construir negócios, e permitir que os consumidores comprem com seu cartão, com um cartão Visa, tão fácil quanto comprar qualquer coutra coisa, é algo útil e relevante. Estamos comprometidos com o ecossistema cripto, em pensar como podemos melhorar a experiência dos usuários e levar essa tecnologia ao maior número de pessoas.
FoM: Qual o impacto que os NFTs podem ter no mercado de criptoativos e no comércio global?
CS: Os NFTs têm apelo a um público maior do que a parte financeira e de investimentos, e pode se tornar uma ferramenta poderosa para pequenos e médios negócios. É comparável com o surgimento do e-commerce, que permitiu a pequenos negócios expandir o seu alcance com vendas online. Mas, neste caso, eles ainda tinham que produzir e enviar ítens físicos, que têm custos elevados. Os NFTs dão a oportunidade aos indivíduos e pequenos negócios de produzir um item digital, que pode ser enviado instantaneamente para uma carteira de criptoativos. Então, enxergamos esse futuro onde o seu endereço cripto será tão importante quanto o seu endereço, e isso pode diminuir a barreira entre criadores, indivíduos e consumidores, para que negociem novos produtos, novos objetos, online. E isso é ótimo para o comércio digital global.
FoM: Você acha que o mercado de criptoativos pode ajudar a promover a inclusão financeira? Os NFTs podem ser uma porta de entrada para este universo?
CS: Uma das razões pelas quais ficamos muito empolgados com o ecossistema cripto, é porque acreditamos que o setor tem o potencial de aumentar a inclusão financeira, o empoderamento financeiro, e ajudar as pessoas a construir riqueza. Acho que os NFTs adicionam um ângulo interessante conforme se torna mais popular, de ser a porta de entrada, por exemplo, para uma carteira de criptoativos. Pense, por exemplo, num músico que, num futuro próximo, decide fazer um show, e coloca os ingressos à venda como NFTs. Os consumidores terão que baixar uma carteira cripto para receber e usar ou vender esse ingresso. Agora essa pessoa tem uma carteira cripto, tem um NFT. É um caminho para que ela faça parte de todo um ecossistema de serviços financeiros. Música, games e cultura sem dúvidas podem ser uma porta de entrada para a inclusão financeira, e o NFT está conectado a esses universos.
FoM: A Visa pretende emitir seus próprios NFTs em algum momento?
CS: Estávamos muito animados em explorar e aprender, essa é a cultura que tentamos desenvolver na equipe de cripto da Visa. Voltando ao e-commerce, seria muito dificil desenvolver algo relacionado a isso se você nunca tivesse comprado nada online, se nunca tivesse usado um e-commerce. Então é a mesma situação agora com blockchain. Para entender como podemos usar essa ferramenta, o que podemos construir, o que podemos criar e oferecer para nossos clientes, precisamos primeiro aprender, experimentar, explorar, usar. E assim levaremos produtos melhores aos nosso clientes.
FoM: A Visa já tem parcerias com empresas de criptoativos para permitir pagamentos com cartões, utilizando saldo em cripto. Esse tipo de atuação vai ser expandida? O que mais a companhia pretende fazer no setor?
CS: Estamos empolgados com a missão de nos tornar essa ponte entre empresas de criptoativos e a nossa rede de lojistas. Trabalhamos com empresas líderes do setor, como Coinbase, Crypto.com, BlockFi, FTX, e esperamos que podemos expandir os programas já existentes, e esperamos levá-los também para outras empresas, para novas empresas. Inclusive temos o programa Visa Fast Track, onde ajudamos o desenvolvimento de startups, inclusive de criptoativos, e estamos abertos a negócios e animados em ser parceiros dessas fintechs e empresas de criptoativos, ver o que eles estão construindo e como podemos ajudá-los, como podemos garantir o melhor produto, o melhor serviço para os consumidores.
FoM: O número de 1 bilhão de dólares em pagamentos com criptomoedas é expressivo para este universo, mas praticamente irrisório perto do volume global da companhia. Isso vai ser diferente no futuro?
CS: É um mercado ainda muito recente, e isso é uma das melhores coisas sobre ele. O volume de compras com criptoativos na rede Visa chegou a 1 bilhão de dólares, contra trilhões de dólares em moedas fiduciárias. É algo ainda muito pequeno, mas o crescimento disso é impressionantemente rápido. Nosso objetivo é estar por perto, apoiar e ajudar desenvolvedores, empreendedores, fintechs e instituições financeiras do mundo todo com os novos produtos que eles estão desenvolvendo, e vemos que mais e mais dessa nova geração de empresas estão sendo construídas no ambiente de criptoativos e blockchain.
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