Como o cenário político pode embaralhar as decisões dos Bancos Centrais nesta Super Quarta
O mundo vai conhecer nesta quarta (31) decisões sobre as taxas de juro de cinco bancos centrais do mundo: Estados Unidos, Brasil, Japão, Colômbia e Chile. Só que, desta vez, não são apenas dados econômicos que serão levados em consideração: elementos políticos devem entrar na conta, ainda que seja na hora de explicar essas decisões nos tão esperados comunicados.
Vamos nos ater aos dois BCs que mais importam para o Brasil: o Federal Reserve (Fed) e, claro, o dirigido por Roberto Campos Neto.
Nos Estados Unidos, a aposta da maior parte do mercado é de que o banco central americano vai preparar o terreno na reunião desta quarta para fazer um corte de juros na reunião seguinte, a de 18 de setembro, a menos de dois meses para a eleição presidencial.
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É sabido que os dirigentes de política monetária não gostam de fazer mudanças nos juros perto de eleições. Primeiro, porque eles podem ser acusados de tentar favorecer um lado ou outro. É aquela história: corte de juros costuma ser uma boa notícia para a população. E nem sempre está claro que o BC tem independência em relação ao governo.
Mas não é só isso. Uma das atribuições da autoridade monetária é contribuir para a estabilidade monetária. Movimentos de juros de qualquer banco central têm potencial para trazer volatilidade aos mercados. Ainda mais o Fed, o BC dos BCs, que sempre influencia o comportamento do dólar e, consequentemente, do câmbio global.
É por isso que, durante algum tempo, analistas acreditavam que um corte de juros pelo Fed teria um prazo limite: ou ocorreria agora ou só no ano que vem.
No entanto, indicadores econômicos recentes – e principalmente a forma como os dirigentes do Fed os avaliaram – estão pesando mais no jogo de expectativas: mesmo com as eleições à vista, o corte de juros deve acontecer em breve. Pelo menos é o que o mercado pensa hoje.
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Essa aposta está embasada em dados de inflação mostrando alívio no segundo trimestre. E em números sugerindo que a economia pode estar desacelerando mais do que o previsto, embora lentamente, puxada principalmente pelo mercado imobiliário e pela fraqueza do consumo na população de baixa renda. Variáveis que sugerem que os juros mais altos, entre 5% e 5,5%, já estão produzindo seu efeito. E que, agora, pode ser a hora de trazer algum alívio.
O que pode embaralhar esse cenário é a política. Em setembro, o jogo eleitoral vai estar super quente e movimentos do Fed precisarão ser calculados com muito mais precisão, sob o risco de gerar instabilidade adicional.
Tem ainda um agravante nessa história: na visão dos analistas, um eventual governo Trump tende a ser inflacionário. Explica-se: o republicano vem com um discurso bastante protecionista, especialmente em relação à China: sua campanha fala em taxar as importações de modo geral em 10%, e as chinesas em 60%. Seria um choque capaz de impactar o PIB chinês e gerar inflação de forma geral.
Hoje, o cenário eleitoral americano está bastante dividido, dizem os especialistas. Então não há razão para incluir esse elemento nas contas da política monetária. Mas, e se Trump estiver mostrando vantagem, o Fed ficaria confortável para cortar o juro? A única coisa que dá para afirmar é que o presidente do Fed, Jerome Powell, terá de ser bem didático ao justificar sua decisão. Seja ela qual for.
E no Brasil?
No Brasil, a questão política também se mistura às planilhas. É que, ao menos pelo lado dos números, parece que tudo aponta para uma tendência ao aumento do juro:
- A projeção para o IPCA de 2025 subiu de 3,90% para 3,96% na última pesquisa Focus, do Banco Central, bem acima da meta de 3%;
- O IPCA-15 de julho subiu 0,30%, acima do esperado, elevando a inflação acumulada em 12 meses para 4,45%, também bem acima da meta.
- O mercado de trabalho segue bastante aquecido, o que representa uma pressão inflacionária: dados do Cadastro Geral do Emprego (Caged), divulgados nesta terça-feira (30) mostraram a geração líquida de 1,3 milhão de empregos, o melhor resultado semestral desde 2021.
Só que, também aqui, entra uma questão política: a definição do nome do próximo presidente do Banco Central, que será indicado por Lula (e você sabe o quanto o presidente vem cobrando um corte de juros) e que assume o cargo a partir de janeiro de 2025. Tudo indica que o sucessor de Campos será Gabriel Galípolo, hoje diretor de Política Monetária, indicado por Lula.
Campos fica no comando do BC até dezembro. Mas antes disso, no máximo até novembro, o nome de seu sucessor já estará confirmado. E é aí que fica a dúvida: com o nome de Galípolo assegurado, o BC seguirá a cartilha de Campos Neto? Ou ainda: ter a confirmação de Galípolo pode ser motivo para haver mais uma vez uma divisão do BC (quatro dos nove diretores atuais foram indicados por Lula) em uma eventual decisão sobre alta do juro?
Como dizem, política monetária nem sempre é uma ciência exata.