Ethereum centralizado: analistas comentam se Lido pode dominar a rede
Lido domina um terço de todo Ethereum em staking e preocupa comunidade de criptoativos
A Lido, plataforma de staking líquido, domina 32% de todo o suprimento de Ethereum (ETH) em staking atualmente, aponta a plataforma de dados Nansen. O montante alto preocupa investidores e entusiastas, apontando para um movimento de centralização do poder de validação da rede. Fontes ouvidas pelo Cointelegraph Brasil afirmam que a preocupação é real, e comentam quais são os mecanismos para remediar este problema.
Dominância da Lido preocupa
A preocupação com a centralização do poder de validação da rede Ethereum existe e não é recente, afirma João Kury, cofundador da plataforma Modular Crypto. Desde maio de 2022, a própria Lido discute possibilidades de limitar o máximo de staking em sua plataforma. A medida foi até para votação da DAO [organização autônoma descentralizada], contudo, não foi aprovada, com uma rejeição de mais de 99% dos votantes”, conta Kury.
Além disso, membros influentes da comunidade Ethereum advogam por limites, diz o cofundador da Modular Crypto. Um exemplo mencionado por ele é Vitalik Buterin, cocriador do Ethereum, que propôs um limite de 15% para projetos de staking.
O staking de ETH é a forma que usuários da rede Ethereum possuem de se tornarem validadores da rede, colaborando diretamente com sua segurança. Embora sejam recompensados pelo serviço com um percentual do valor depositado, os usuários perdem a liquidez de seus criptoativos que estão em staking.
A Lido popularizou, no entanto, o modelo de staking líquido. Ao deixar seu saldo de ETH em staking junto à plataforma, uma quantidade de tokens representando o valor alocado é gerada. No caso da Lido, o token é o stETH.
Através do stETH, investidores podem interagir com diferentes aplicações descentralizadas que aceitem o criptoativo. Por ser pioneira nesse setor, a Lido conquistou sua dominância, aponta Rony Szuster, analista de criptoativos do MB Research.
“Ter um terço das ETH em staking em um ente não é uma coisa muito boa. […] A Lido é muito grande pelas possibilidades de integração com stETH, que pode ser usado como colateral, ou até em staking novamente. […] O segmento todo está crescendo, mas a Lido está expandindo mais rápido, talvez, pela sua vantagem de ser a primeira nesse mercado”, afirma Szuster. O segmento mencionado pelo analista é o de derivativos de staking líquido (LSD, na sigla em inglês).
Concorrência agindo como freio
O setor de LSD, embora seja dominado pela Lido, conta com outras empresas oferecendo serviços de staking líquido, como Rocket Pool, Staked e Stake Fish. Esse ecossistema conta até mesmo com exchanges centralizadas, como Binance, Coinbase e Kraken.
Uma parte da comunidade do Ethereum acredita que mesmo no cenário onde há um grande player no setor de LSD, haverão concorrentes relevantes, diz João Kury, da Modular Crypto. Sob esta ótica, a concorrência de outros participantes pode limitar a dominância da Lido.
“[A concorrência] já está se acirrando à medida que o setor de staking continua a crescer e novos protocolos e soluções são desenvolvidas, inclusive com retornos melhores do que os da própria Lido, como observamos na Frax ou na Stakewise”, acrescenta Kury.
A plataforma de staking líquido Rocket Pool, com seu token RETH, é um exemplo de concorrente que pode reduzir a dominância da Lido, diz Rony Szuster, do MB Research. “O RETH está começando a ter mais casos de uso em outras aplicações, como staking na EigenLayer e como colateral de empréstimo na Aave”, explica Szuster.
O menor dos males?
Existe outra parcela da comunidade do Ethereum que entende vê a possibilidade do mercado de staking pode se tornar um cenário onde o vencedor leva tudo, diz João Kury, da Modular Crypto. Em outras palavras, existem entusiastas que acreditam que o futuro natural desse setor é ser dominado por uma entidade, impulsionada por fatores como liquidez, composabilidade e efeitos de rede, acrescenta Kury.
“Nesse cenário, essas pessoas acreditam ser mais favorável ter a Lido como player dominante do que deixar isso aberto para que corretoras centralizadas, como Coinbase e Kraken, assumam a frente”, diz o cofundador da Modular Crypto.
Restrições no código
Mesmo que seja uma possibilidade, nada garante que a concorrência de outros players será suficiente para limitar o interesse na Lido. Dados da Nansen apontam que o volume de ETH em staking fora de exchanges tem crescido nos últimos meses, levando também ao crescimento do setor de LSD. Não houve, porém, uma redução na dominância da Lido.
Desta forma, mecanismos implantados no código não estão fora de cogitação. Rony Szuster, do MB Research, destaca os esforços feitos pela própria Lido em fevereiro, para tentar reduzir o volume de depósitos em sua plataforma.
Conforme noticiado pelo Cointelegraph, os esforços mencionados por Szuster se referem à redução de stETH gerados em um único dia. Esse mecanismo é ativado quando mais de 150 mil ETH são colocados em staking na Lido em um único dia.
Szuster comenta ainda que a Lido conta com a possibilidade técnica para limitar o total de ETH em staking, embora não existam discussões sobre isso atualmente. O que se discute, destaca o analista, é a limitação em 30 milhões de ETH como total que pode ser colocado em staking. Essa discussão, contudo, faz parte da comunidade de desenvolvedores do Ethereum, e não da Lido.
“A discussão do limite ainda está em andamento, e não significa que ele será implementado. Após atingido o limite de 30 milhões, novos depósitos de ETH não entrariam no processo de validação, e os validadores existentes se revezariam para manter a segurança da rede”, explica Szuster. “Mas isso não garante que não haverá dominância da Lido dentro desses 30 milhões”, acrescenta.
João Kury, da Modular Crypto, também afirma que existem discussões sobre limitações a serem impostas no processo de staking. Ele ressalta, porém, que é muito improvável que essas implementações ocorram diretamente no código da rede Ethereum.
“Ao mesmo tempo, muitos acreditam que alguma medida precisa ser tomada pela própria comunidade para que seja evitada a dominação do staking pela Lido, ou por qualquer outro player”, conclui Kury.
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