Banco Central, MP, COAF e CVM temem revisão na lei de combate a lavagem de dinheiro

Reguladores do país não querem mudanças na lei de lavagem de dinheiro e nem punições mais brandas para quem pratica o crime usando Bitcoin

Dirigentes do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), do Banco Central, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e do Ministério Público se mostraram temerosos com a proposta da Câmara dos Deputados de revisar a Lei da Lavagem de Dinheiro.

Segundo as instituições o Brasil precisa continuar seguindo as 40 recomendações do Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi).

O presidente do Coaf ressaltou que as normas brasileiras atuais sobre lavagem de dinheiro são consideradas alinhadas às recomendações do Gafi e serão novamente avaliadas pelo grupo no próximo ano. Essa avaliação seria essencial para manter o grau de risco financeiro internacional do Brasil.

“É claro que é possível aprimorar as leis e os regulamentos, esse é o nosso propósito permanente, de estar sempre alinhado às novidades que o mundo nos oferece a cada dia, novas tecnologias, novos negócios, novas tipologias, e nós estamos sempre atentos a identificá-las, persegui-las e mitigá-las, na medida em que essa é nossa função como órgão de Estado. Mas sempre tendo como referência as recomendações do Gafi e os compromissos de acordo internacionais”, ponderou.

Banco Central

Maurício Moura, diretor do BC, salientou que qualquer desalinhamento às recomendações do Gafi pode ter “implicações econômicas graves” para o Brasil.

“Obviamente isso reduz muito a atratividade do país ao investimento estrangeiro, o próprio risco do país aumenta muito, dificulta ainda mais nos retornarmos ao grau de investimento, isso praticamente bloqueia nossa entrada na OCDE, o chamado clube dos países ricos, o que reduz o nosso reconhecimento mundial como país atraidor de investimentos”, disse.

Ele também rejeitou alterações profundas na Lei da Lavagem de Dinheiro e destacou, especialmente, a importância da autonomia do crime de lavagem de dinheiro. Na avaliação de Moura, qualquer alteração nesse ponto, para elencar crimes antecedentes ao de lavagem de dinheiro, seria “retrocesso”.

Para ele, o aprimoramento da lei deveria se restringir a “pontos muitos específicos”. Os representantes do Coaf e do Banco Central vão encaminhar até 15 de novembro sugestões à comissão.

CVM

Representante da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla), formada por mais de 90 entidades dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, Edson Garutti considera o momento inadequado para rever a lei.

“É com grande preocupação que as instituições membros da Enccla estão vendo esse movimento de revisão da Lei de Lavagem de Dinheiro neste momento. É um momento de avaliação do Brasil pelo Gafi”, apontou.  Para ele, o momento para o Brasil revisar a lei deve ser posterior à avaliação do Gafi das normais e práticas atuais.

Garutti salientou que “a lavagem de dinheiro não tem sido combatida a contento no Brasil” e criticou a falta de delegados de polícia na comissão de juristas, que tem 19 integrantes, entre magistrados, membros do Ministério Público, acadêmicos e especialistas. “É a categoria que toca 90% das investigações sobre lavagem de dinheiro”, observou.

Alexandre dos Santos, superintendente geral da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), também considera que “as conquistas da lei não devem ser objeto de discussão agora”, e que qualquer a reformulação deve ser cuidadosa.  Conforme ele, qualquer interpretação de que o Brasil enfraqueceu a lei pode afastar investimentos.

 

Bitcoin

Representantes dos conselhos nacionais de Justiça (CNJ) e do Ministério Público (CNMP) também pediram cuidado para que não haja retrocessos na lei para o crime de lavagem de dinheiro. 

Segundo Mário Guerreiro, conselheiro do CNJ, é importante que qualquer alteração evite ainda mais impunidade, uma vez que, em sua visão, o sistema já é seletivamente punitivista.

“Se a gente somar as penas por crimes contra o patrimônio, roubo e furto, principalmente, e crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico, isso corresponde a 70% da população carcerária brasileira. Agora, se nós formos ver crimes praticados por particular contra administração pública, segundo dados do Depen, são 0,18% dos presos. Nós temos um sistema punitivo no Brasil que é bastante eficiente contra a população de baixa renda, empobrecida.”

Já o procurador regional da República Bruno Calabrich também defendeu que a ocultação não seja retirada do tipo penal, o que poderia aumentar a impunidade. O procurador acredita que a onda punitivista, no Brasil, nunca atingiu crimes mais graves como homicídio, estupro, corrupção e lavagem de dinheiro.

Por isso, ele defende que qualquer revisão em penas para o crime de lavagem não vá no sentido de reduzi-las, mas sim de aumentá-las, em determinados casos.

“Por exemplo, quando houver lavagem de dinheiro transnacional, quando houver lavagem de dinheiro com utilização de meios sofisticados de lavagem, com a utilização de criptomoedas, diminuir as penas deve estar fora de cogitação.”

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