O Brasil chega ao quinto Projeto de Lei sobre criptoativos, mas ainda sem uma definição do ponto de vista tributário

Brasil tem 5 projetos de lei sobre criptomoedas mas nenhum chegou a qualquer conclusão ainda

Este texto foi escrito por Allan Fallet é advogado tributarista e sócio do J Amaral Advogados.

Nas últimas semanas, o Senado Federal vem debatendo o Projeto de Lei (“PL”) n° 4207/20, que dispõe, dentre outros, sobre os ativos virtuais e sobre as pessoas jurídicas que exerçam as atividades de intermediação, custódia, distribuição, liquidação, transação, emissão ou gestão desses ativos virtuais, sobre crimes relacionados ao uso fraudulento de ativos virtuais, bem como sobre o aumento de pena para o crime de “pirâmide financeira”.

Vale esclarecer que tal PL, de uma forma geral, (i) estabelece normas para a emissão de moedas e outros ativos virtuais, (ii) trata das condições e obrigações para as pessoas jurídicas que exerçam atividades relacionadas a esses ativos, (iii) atribui competências fiscalizatórias e regulatórias à Receita Federal do Brasil (“RFB”), ao Banco Central do Brasil (“BCB”), à Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) e ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (“COAF”), (iv) e tipifica condutas praticadas com ativos virtuais com o objetivo de praticar crimes contra o Sistema Financeiro, inclusive os de pirâmide financeira.

Além disso, também cria o Cadastro Nacional de Pessoas Expostas Politicamente (“CNPEP”), com a finalidade de auxiliar as instituições financeiras a executar políticas de avaliação de risco de crédito e de prevenção à lavagem de dinheiro.

Tendo em vista os valores envolvidos e o potencial desse setor a ser explorado, a título ilustrativo a RFB divulgou que foi movimentado um montante próximo de 27 bilhões de reais em criptoativos no Brasil no primeiro trimestre de 2020, sendo mais de 10 bilhões de reais apenas em fevereiro.

O Brasil é o segundo país que mais compra criptoativos no mundo, perdendo apenas para a Turquia. Ou seja, cerca de 18% dos adultos brasileiros investem ou já investiram nesse mercado.

Diante do avanço da tecnologia, hoje existem diversos criptoativos em negociação, como BITCOIN, BITCOIN CASH, CHILIZ, PAX GOLD, USD COIN, XRP, WIBX,
RIPPLE, ETHEREUM, LITECOIN, DASH, FUTECOIN e outros ativos digitais como os tokens de ativos reais (precatórios, consórcios etc), o que remodela toda a dinâmica de investimentos no Brasil e muda todo o funcionamento dos órgãos regul adores.

A regulação dessa atividade exige novas premissas dos entes federativos, o que ocasionou em diversas iniciativas parlamentares elaboradas desde o ano de 2015, como os PL’s n°s 2303/15 (dispõe sobre a inclusão das moedas virtuais e programas de milhagem aéreas na definição de “arranjos de pagamento” sob a supervisão do BCB) e 2060/19 (dispõe sobre o regime jurídico de criptoativos), ambos em tramitação na Câmara dos Deputados, e 3825/19 (disciplina os serviços referentes a operações realizadas com criptoativos em plataformas eletrônicas de negociação), 3949/19 (dispõe sobre transações com moedas virtuais e estabelece condições para o funcionamento das exchanges de criptoativos) e o 4207/19, esses em tramitação no Senado Federal.

Em uma primeira análise desses PL’s, resta clara a ausência de um tecnicismo quanto ao conceito de criptoativos e demais itens disruptivos da economia digital, como exchange, blockchain dentre outros, o que dificulta a análise em conjunto, ou convergência de proposições, bem como a continuidade das discussões a partir da primeira iniciativa.

Um ponto que deixou de ser enfrentado nos PL’s foram os desafios quanto à tributação dos criptoativos em face das especificidades e limitações impostas pelo complexo sistema tributário brasileiro, como podemos observar no artigo quinto do PL n° 4207/20, o qual estabelece que competirá a RFB a tributação, a fiscalização, a arrecadação e a cobrança das atividades descritas.

Em seus artigos sexto, sétimo e oitavo, ocorre a delegação de supervisão e regulação, respectivamente, com BCB, CVM e COAF.

Para fins tributários, a Instrução Normativa (“IN”) n° 1.888/19, que instituiu e disciplinou a obrigatoriedade de prestação de informações relativas às operações realizadas com criptoativos, trouxe um norte do que irá acontecer e principalmente definiu o conceito de criptoativos como a representação digital de valor denominada em sua própria unidade de conta, cujo preço pode ser expresso em moeda soberana local ou estrangeira, transacionado eletronicamente com a utilização de criptografia e de tecnologias de registros distribuídos, que pode ser utilizado como forma de investimento, instrumento de transferência de valores ou acesso a serviços, e que não constitui moeda de curso legal.

A IN n° 1.888/19 em conjunto com a manifestação da RFB sobre o tema através do Perguntas e Respostas da Declaração do Imposto de Renda das Pessoas Físicas, foram os primeiros passos para o enquadramento desses ativos como passíveis de tributação.

Portanto, a ausência de compreensão técnica adequada e do enfrentamento do viés tributário, sem a percepção de possíveis questionamentos por outros Entes da Federação, gera insegurança jurídica e proporciona um caminho aberto para os devaneios no campo da tributação.

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