Blockchain não faz milagres: Produtores de carne no Brasil enfrentam pressão internacional para certificar produção

Os produtores de carne do Brasil correm para certificar a produção usando tecnologias como blockchain como aliada, mas desmonte do governo e pequenos produtores vão na contramão da sustentabilidade.

Os grandes produtores de carne do Brasil já enfrentam pressão internacional para certificarem o fornecimento no combate ao desmatamento ilegal no Brasil, mas mesmo com a tecnologia blockchain como aliada não conseguem cumprir suas metas, como mostra matéria do Estadão.

O Brasil já concentra 46% dos abates de bovinos na Amazônia legal, mas até mesmo empresas que se dizem preocupadas com a sustentabilidade como JBS e Marfrig admitem que não monitoram seus fornecedores diretos.

10 milhões de cabeças de gado foram abatidas dentro das áreas protegidas da floresta, segundo dados do Ministério da Agricultura. As grandes produtoras já admitem que “por enquanto” não conseguem garantir que a produção não seja fator de destruição para a floresta.

Pressão internacional e desmonte doméstico

A pressão enfrentada pelos grandes produtores de carne no Brasil vem principalmente de fora do país, com a aceleração do desmatamento e exigências de certificados de sustentabilidade para importação, mas também do varejo brasileiro nas maiores cidades.

Em maio, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a destruição da floresta cresceu 40% com relação ao mesmo mês de 2020, com grande participação da pecuária na destruição do ecossistema brasileiro.

A iniciativa privada tenta se organizar para também cobrar os produtores: grandes bancos como Itaú, Bradesco e Santander lançaram um fundo para o desenvolvimento sustentável na floresta.

Apesar disso, as maiores produtoras de carne, JBS, Marfrig e Minerva, admitem que não conseguem certificar seus produtos com selo de sustentabilidade, mesmo com os investimentos recentes em blockchain e monitoramento via satélite. O problema, garantem, está nos “pontos cegos” da cadeia de produção: fazendas terceirizadas pelas quais os animais passam antes de chegar às parceiras diretas das empresas.

Mesmo assim, JBS e Marfrig traçaram uma meta de garantir toda a produção de carne até 2025, comparando com outros países que já avançaram neste setor. Paulo Pianez, diretor de sustentabilidade da Marfrig, comenta:

“O desafio que a gente tem é a identificação dos fornecedores indiretos. Ao contrário de Austrália e Uruguai, não implantamos a identificação de origem desde o nascimento. E tudo o que é voluntário tem adesão baixa. Foi uma oportunidade perdida.”

Só a Marfrig não tem controle sobre 40% da carne processada em suas fábricas, uma parcela considerável da produção. A empresa criou um cadastro de fornecedores indiretos para tentar validar as informações junto a órgãos ambientais.

Já a JBS lançou um sistema em blockchain que conta com 100 mil fornecedores cadastrados, dos quais 11 mil já foram bloqueados por tendências ambientais. Os pecuaristas também podem procurar a empresa para prestar informações e sanar pendências para regularizarem a produção.

José Carlos Hausknecht, diretor da consultoria MB Agro, porém, diz que o problema do mercado hoje é que ele funciona “à vista”, com as fazendas vendendo tanto para grandes frigoríficos, interessados na sustentabilidade da produção, quanto para os pequenos, que não têm a mesma obrigação com o cliente final:

 “A verdade é que são esses grandes frigoríficos que não querem correr o risco (de ter sua produção ligada à destruição da floresta). Já os pequenos frigoríficos vão continuar trabalhando com produtos de áreas com problemas”

Outro fator que atrapalha na sustentabilidade da produção de carne é o desmonte ambiental comandado pelo governo Jair Bolsonaro. O Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, comandou o desmonte de quase todos os órgãos de fiscalização e mais de uma vez intercedeu junto a órgãos ambientais a favor de quem destrói a floresta. Ele é investigado a pedido da Procuradoria Geral da República por corrupção.

Os dados da devastação comprovam a intenção de acelerar a destruição em nome de interesses econômicos privados. Só no governo Bolsonaro, a devastação é a maior dos últimos 20 anos, com números crescentes não só na Amazônia como também em outros biomas como o Pantanal, que foi vítima de incêndios criminosos em 2020.

Mesmo o Ministério da Agricultura não demonstra grande interesse em proteger a floresta. Por e-mail, o ministério respondeu de forma curta na matéria:

“No tocante às infrações ambientais, a legislação pertinente é a Lei de Crimes Ambientais que traz diretrizes para combater a ilegalidade”

LEIA MAIS

Você pode gostar...