A Receita Federal vai garantir a segurança de quem declarar Bitcoin?

A partir desta quinta-feira (1º) todos os usuários de criptomoedas do Brasil, que tiverem uma movimentação a partir de R$ 30 mil reais, deverão notificar mensalmente a Receita Federal Brasileira.

O usuário deverá declarar todas as operações — não apenas compra e venda —, mas sim todo tipo de operação com criptomoedas que somadas ultrapassem R$ 30 mil. 

Talvez aos olhos da Receita Federal isso seja uma maneira de tentar entender o que está acontecendo com o mercado mês a mês e sua evolução, ou de tentar identificar quem são os usuários, o quanto está sendo movimentado, onde e como as criptomoedas estão sendo utilizadas.

E esta obrigação não é só dos usuários, mas também das corretoras brasileiras de criptomoedas e dos vendedores P2P. 

Outro parágrafo curioso da Instrução Normativa (IN) nº 1.888/2019 diz que brasileiros que moram no exterior também são obrigados a declarar suas movimentações em criptomoedas, mesmo que operem em outros países, caso o valor supere R$ 30 mil mensais.

Ou seja, simplesmente por ser brasileiro, mesmo que não pisem em seu país de origem, que não faça transações com ativos ou com dinheiro no Brasil, ainda assim esse cidadão está devendo informações à Receita Federal do Brasil.

Talvez aos olhos da Receita, isso realmente seja uma maneira de dar uma cara ao mercado e aos usuários das criptomoedas, de tentar identificar quem opera, como, onde e por quê. 

Outro ponto que deve ser analisado com cuidado é que tem muito usuário ainda confundindo a IN que obriga a declarar as operações com o recolhimento mensal de ganho de capital, por exemplo.

Porém, a IN ainda está muito crua, e muitos usuários que às vezes já têm dificuldades em abrir uma conta e entender como funciona o mercado. Imagine agora que ele precisa declarar toda e qualquer operação — todos os meses!

Os clientes têm dúvidas, por exemplo, em relação à oscilação do preço do bitcoin — se precisam declarar simplesmente porque o valor do criptoativo subiu e o que fazer também em caso de queda do valor.

São complicações no dia a dia para os usuários de criptomoedas. Talvez a Receita poderia ter tomado o cuidado de primeiro entender o funcionamento do mercado.

E chamar os principais players para conversar, entre usuários e corretoras, para encontrar uma melhor dinâmica nesse primeiro momento e se a entrega mensal pode acabar confundindo os clientes e as corretoras que operam.

Na minha visão, a fala da Receita está equivocada ao querer impôr já a declaração mensal sem entender como o mercado de criptomoedas funciona.

Poderiam começar com uma declaração anual ou semestral para sentir a movimentação do mercado, e, em um momento de maior amadurecimento dos órgãos públicos e reguladores em relação ao uso desta nova tecnologia, aí sim, transformar em algo mensal.

Mas tem o outro lado da moeda que a gente não está olhando, e que me preocupa muito.

Agora, além do fato de que o usuário vai declarar tudo que é operação em criptomoeda para a Receita — e minha recomendação é que declare tudo mesmo, toda movimentação, para que evite problemas futuramente.

Receita Federal e segurança

O outro lado da moeda é: e a segurança disso, como fica?

Constantemente vemos notícias de informações da Receita Federal sendo vazadas e fica a pergunta: quantas pessoas do governo têm acesso à base de dados?

Em uma conta básica: quantos funcionários do governo federal e do governo estadual teriam acesso às informações levantadas, mês a mês, sobre quem tem ou quem opera com criptomoedas?

Fazendo uma conta por alto, cerca de 10 mil funcionários públicos? Agentes de polícia federal e estadual, funcionários do Ministério Público? Quantos estariam suscetíveis a vazar ou vender dados, seja sendo coagidos ou levados a vender esses dados por outros motivos?

Agora vamos levar a um exemplo extremo, porém não impossível de acontecer.

Vamos supor que eu compre mensalmente um bitcoin a cerca de R$ 30 mil e informo a Receita. Em dez meses, eu guardei cerca de R$ 300 mil com 10 bitcoins.

Porém, o bitcoin subiu e agora vale R$ 100 mil cada — eu tenho, então, R$ 1 milhão. Quanto vale essa informação para um grupo terrorista de outro país? As pessoas hoje invadem as casas das outras para roubar TVs e matam na rua para roubar iPhone.

Agora, imagine que estamos falando de uma tecnologia super poderosa que me permite transferir dinheiro digital de um lado do mundo para outro, em poucos minutos, de maneira anônima, a qualquer horário do dia ou da noite.

Se esses dados de alguém com 10 bitcoins ou mais, são vendidos ou vazados, R$ 1 milhão de reais me torna um alvo fácil.

Vale uma visita deles à minha casa, colocar uma arma na minha cabeça e ameaçar minha família, para que eu transfira minhas criptomoedas para a carteira deles, certo?

Diferente do sistema bancário atual e da liquidez de ativos tradicionais, onde eu dependeria do horário bancário, liberação do gerente e outras burocracias, quando falamos em criptomoedas, estamos falando de agilidade 24 horas por dia e de anonimato.

A dinâmica é totalmente diferente. Por isso eu volto a bater na tecla de conversarmos com os órgãos públicos e reguladores, de sermos ouvidos, para que eles então possam entender esta dinâmica nova de mercado e que possam defender melhor os interesses do público brasileiro.

Precisamos estar a par dos dois lados da moeda: da Receita, em entender e analisar o funcionamento do mercado, mas também do usuário — principalmente por sua segurança física quando seus dados são expostos, deixando-o em situação de extremo risco.

Dia 1º de agosto está aí, e a pergunta que fica é: será que a Receita Federal consegue garantir minha segurança, assim como ela consegue garantir o quanto vai arrecadar? É de se pensar.

Sobre o autor

Rocelo Lopes é cientista da computação pioneiro no desenvolvimento de tecnologias para o mercado de criptomoedas. Fundou a Othos Telecom, coinBR.net, coinPY.net e a Stratum Blockchain Technology.

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